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Porandubas nº 529

sexta-feira, 12 de maio de 2017

Atualizado às 07:55

Abro a coluna com um "causo" contado por Zé Abelha nas Minas Gerais.

Mudou de nome?

Mariana, em Minas Gerais, já foi chamada de Roma brasileira. Terra de fé e de velhas igrejas. E cheia de placas com nomes engraçados nas ruas:

- Cônego Amando

- Armando Pinto

Cônego Amando era conhecido pela verve. Um dia, viajando pelo interior do município, uma de suas acompanhantes caiu do cavalo. Rapidamente ficou em pé. Meio sem graça, perguntou ao Cônego:

- O senhor viu a minha agilidade?

- Minha filha, respondeu, eu até que vi. O que eu não sabia é que tinha mudado de nome.

Um pouco maior

Peço licença ao leitor por lhe apresentar uma coluna um pouco mais longa. Faço uma análise do depoimento de Lula, com projeções sobre o amanhã.

Lula bate Moro?

Vamos às hipóteses: Luiz Inácio conseguiu ser tão convincente que deixou o juiz Sérgio Moro no canto do ringue. Tem sentido essa hipótese? Não. Mas a torcida organizada de Lula acha que seu ídolo fez barba, cabelo e bigode. A verdade: o juiz teve a bola na mão e o apito na boca. Esteve sereno. Não se afobou. Conduziu tecnicamente o jogo. As delações de Léo Pinheiro e Renato Duque deram munição às perguntas. Mas o ex-presidente, como se sabe, é um mágico da prestidigitação com palavras. Saiu-se bem. Sem o rompante palanqueiro tão aguardado pela militância. Insistiu que o tríplex nunca foi dele e que nunca recebeu propina. Marisa, a falecida esposa, é quem tinha interesse naquele imóvel. Lula conhece a regra do martelo: bata, bata, bata no mesmo prego e ele acabará fixando-se na parede ou, se quiserem, na cachola das massas.

Moro bate lula?

O maior líder populista do país foi nocauteado? Também não. Mesmo sem disfarçar o nervosismo, tentou responder a algumas perguntas. Sobrou, mais uma vez, a expressão: não sei, não soube, não sabia. Tentou trazer o juiz para o campo político: "quando o senhor for candidato". Tentou puxar Moro para a intimidade do lar, ao sugerir que o filho não diz ao pai as notas baixas que tirou na Escola; nesse ponto, recebeu uma estocada. Moro garantiu que sabe das notas de seus filhos. Perguntas duras e diretas feitas pelo juiz Moro deixaram Lula nervoso, mas não a ponto de deixarem-no no canto do ringue. O juiz teve o comando do jogo. E pôde apitar toda vez que achou necessário, principalmente quando percebeu que o protagonista saía pelas tabelas ou pelas veredas do sofisma.

Um jogo técnico

Não houve mocinho nem herói. Viu-se um juiz técnico apurando respostas. Viu-se um Lula nervoso em alguns momentos, mas sob severo rigor da liturgia. Quando procurou escapar do clima solene, chamando procuradores de "você", foi advertido. Para ele, o tratamento foi retilíneo: ex-presidente. É evidente que, pela polarização entre a ala que apoia a Lava Jato e o grupo que escuda Lula, o jogo pode ter sido considerado empatado. Cada lado dirá que ganhou. Aplausos e apupos recíprocos. A mídia massiva dará o tônus do debate, puxando uma brasinha para um lado ou para outro. As redes sociais se dividiram em xingamentos e loas. Ao final do processo, a impressão é a de um Lula ainda muito vivo, porém, alquebrado.

Resumo

Um momento tenso foi o relato de Lula sobre o encontro com Renato Duque em um hangar em Congonhas. Afinal, por que um ex-presidente quis se encontrar com um ex-diretor da Petrobras? E mais: para saber se ele tinha depósitos em contas no exterior? Ademais, não era amigo dele, Duque. E por que usar João Vaccari, tesoureiro do PT, como intermediário desse encontro? Essas dúvidas certamente se farão presentes no juízo de Sérgio Moro. Atribuir a dona Marisa (que "odiava praia") o interesse pelo tríplex também não caiu bem. E mais: que ela queria fazer investimento com a aquisição do apartamento. As 50 mil pessoas anunciadas pelo PT, que iriam até Curitiba prestigiar o ex-presidente, se restringiram a umas 7 mil pessoas. A batalha campal não ocorreu. A certeza é a de que o caso seguirá seu curso naturalmente. O juiz Sérgio Moro deve aceitar a denúncia, abrir a fase de nova coleta de provas, ouvir mais testemunhas e proferir sua decisão. Que deve ocorrer entre junho e julho.

Condenação ou absolvição?

Essa é a pergunta recorrente sobre a possibilidade de Luiz Inácio poder ou não ser candidato em 2018. Primeiro, vale lembrar que o veto à eventual candidatura estará circunscrito a uma condenação em 2ª instância. O Tribunal Regional da 4ª região tem dado endosso às condenações proferidas pela 1ª instância do juiz Sérgio Moro. Se essa tendência se confirmar, Moro condenaria Lula e veria sua decisão corroborada pela instância acima. A partir daí, o processo entra no curso natural do Judiciário com os recursos cabíveis e prováveis nas instâncias superiores. Mas, do ponto de vista político, isso não significaria a morte política de Luiz Inácio.

Vitimização

O fato é que o declarado candidato à presidência da República, Luiz Inácio, já começou a lapidar seu perfil com a argamassa da vitimização. Essa é a carta no pacote discursivo que vai utilizar para se apresentar com sua candidatura de oposição ao pleito de 2018. É uma boa ideia? Não. Este consultor tem essa visão: é melhor para Lula a condição de comandante das oposições, em 2018, do que a de candidato. Por quê? Primeiro, deixaria de ser o alvo do bombardeio; segundo, apareceria em comícios por todo o território, lembrando os feitos de seu governo e levantando o véu da nostalgia. Assim, arregimentaria forças na direção de um candidato de oposição. Lula é um dos poucos quadros com capacidade de unir as oposições e unificar a linguagem. Sua capacidade de sensibilizar as massas - por via da mistificação - puxará para cima o tom emotivo de uma campanha oposicionista, com intensa mobilização da militância. Plantaria a semente de resgate do PT, podendo eleger uma bancada poderosa em 2018. Como candidato, volta a canalizar a polarização no país, com o "Nós e Eles". Dessa feita, o "Nós" (PT, Lula e oposições) tende a perder.

Razão x emoção

Luiz Inácio, candidato, perderia a condição de favorito. Principalmente levando-se em consideração a retomada do crescimento do país. Formar-se-á gigantesca onda, a partir do centro da pirâmide, cujos efeitos e impactos chegarão às margens. As classes médias, onde se abrigam poderosos núcleos de formação de opinião, a partir dos profissionais liberais, expandirá sua tuba de ressonância. As marolas expressivas impregnarão as correntes, que terão capacidade de furar os bloqueios emotivos das margens. Significa aduzir que Lula terá condições de resgatar seu PT, mas não de torná-lo vitorioso no ranking partidário. Sua força será suficiente para evitar a débâcle total do petismo. Em suma, o volume de racionalidade, a sair das fontes do meio da pirâmide, será superior aos tonéis de emoção que engolfarão as massas periféricas.

São Paulo, a fonte principal

A fonte principal que jogará a expressão na tuba de ressonância nacional será São Paulo. O mais forte Estado da Federação conta com cerca de 45 milhões de habitantes, ou 22% da população brasileira, 207 milhões. E sua população eleitoral é mais de 32 milhões. O bumbo que se bate em São Paulo é ouvido em todo o país. São Paulo agrega os maiores conjuntos de profissionais liberais, os maiores núcleos de trabalhadores, as maiores classes médias, as maiores densidades em todos os campos populacionais. Por isso, São Paulo terá importância estratégica no quadro eleitoral do país.

Os novos

Uma ligeira conversa com Murilo Hidalgo, do Instituto Paraná Pesquisas, arremete para algumas conclusões: 1. O perfil do novo ganhará ênfase nas próximas eleições. 2. Alguns nomes (novos e mesmo alguns madurões, porém mais assépticos) aparecem: Josué Gomes da Silva, filho do falecido ex-vice presidente da República, José de Alencar, pode ser um bom nome ao governo de Minas Gerais; no Rio, o senador Romário ou mesmo Bolsonaro, o pai, ao cair na real e constatar ser uma fria sua candidatura à presidência; João Doria em São Paulo, caso Geraldo Alckmin seja candidato à presidência. Ainda no Rio de Janeiro, Armínio Fraga e Bernardinho do vôlei; ACM Neto, na Bahia; Ratinho Junior, no Paraná ou mesmo Deltan Dallagnol; Rui Palmeira, em Alagoas; Paulo Câmara, Mendonça Filho ou Bruno Araújo em Pernambuco; e Hélder Barbalho no Pará.

Dirceu solto

A decisão do STF de mandar soltar José Dirceu, ex-todo poderoso manda-chuva do PT, traça uma linha divisória no sistema de prisões temporárias de longo prazo, tão bem acolhido pela primeira instância do Judiciário, sob o guarda-chuva protetor do Ministério Público. A 2ª turma do Supremo impôs limites ao tempo dessas prisões, mesmo diante do parecer do relator, ministro Edson Fachin, a elas favorável. A decisão ganhou intensa repercussão no universo dos operadores do Direito em um momento de polarização entre posições, envolvendo principalmente as visões contrárias de advogados e o insistente posicionamento favorável de procuradores e do juiz Sérgio Moro, este comandando os casos mais contundentes da operação Lava Jato.

Quem tem razão?

Quem tem razão? A 2ª turma do STF ou o MP? A situação deve ser analisada à luz de vários e complexos fatores. Ressalte-se o tom extremamente emotivo com que uns e outros tratam do caso. Um grupo enxerga na decisão de nossa mais alta Corte um golpe frontal contra a operação Lava Jato, enquanto os advogados festejam o ato como gesto de que a Justiça volta ao seu prumo, depois da primeira instância dar guarida a "exageros e aberrações", como alguns chegam a designar as alongadas prisões temporárias. A emoção chama a atenção no meio do turbilhão expressivo que inunda o território da maior investigação sobre corrupção da história brasileira. Mas a emoção acaba encurtando a lógica das partes. Urge tornar a linguagem jurídica mais conceitual e menos pessoal.

Os fatos

É fato que as prisões temporárias se fazem necessárias para apuração acurada de denúncias e servem de escudo contra eventuais ações de implicados no sentido de destruir provas e obstruir, caso estivessem soltos, as veredas da Justiça. Mas é igualmente fato que as detenções não podem ultrapassar determinado limite de tempo, sob a hipótese de que os detidos não foram ainda julgados e a longa permanência em prisão, sem condenação, pode ser considerada como evidência de injustiça. Portanto, na querela aberta tem faltado bom senso. Os verbos e adjetivos raivosos lançados de um lado contra o outro precisam se despir do manto emocional.

Não é politicagem

Não é o caso de marcar com feição politiqueira atitude de ministros que concederam a liberdade ao ex-ministro José Dirceu, sendo uma impropriedade distinguir neles a pecha de "traidores da Justiça", ou, de outra forma, jogar sobre o colo da "meninada" do Ministério Público atributos como "procuradores ingênuos, oportunistas, golpistas, despreparados, desprovidos de caráter", entre outros. O fato de magistrados registrarem, em seu passado, um pedaço de história que os liga a protagonistas da política - partidos ou lideranças - não os desabilita ao cumprimento das altas funções para as quais foram escolhidos. Nem mesmo quando tais figurantes assumem papel de vulto nos gigantescos processos em curso, como é o caso da operação Lava Jato.

A Corte americana

É oportuno lembrar que a escolha de juízes para a mais alta Corte da maior democracia do planeta, a norte-americana, se investe de certo teor político, eis que os perfis costumam ser encaminhados e patrocinados, via de regra, pelos dois maiores partidos, o republicano e o democrata. Mesmo assim, quando há suspeita sobre o voto de determinado ministro, pela ótica de que estará julgando "um amigo, um ex-parceiro de trabalho", ele poderá se considerar impedido de participar do julgamento daquele caso, como tem acontecido em algumas Cortes, principalmente no âmbito do Superior Tribunal de Justiça. A par de questões de natureza ética, que certamente integram o escopo moral dos quadros mais elevados de nossas Cortes, emerge com força a cobertura midiática, feita por grandes veículos da imprensa e pelas mídias sociais.

O maior juiz, a OP

Há um superpoderoso juiz a julgar os julgadores: a opinião pública. Esta se forma a partir do amálgama das opiniões individuais, constituindo um gigantesco estuário em que desembocam as águas oriundas dos canais e filtros que guardam juízos de valor de classes sociais, grupamentos, setores e movimentos. Juízes que fugirem às regras que balizam sua profissão são jogados no palco midiático, onde ganham apupos, vaias, na esteira de um repertório negativo que marca sua identidade e mancha a imagem. Não terão salvação quando jogados na fogueira acesa pela opinião pública. Só conseguirão limpeza parcial de seus corpos depois de uma temporada no inferno até aportarem no limbo, que, nesse caso, significa o esquecimento dos fatos por parte da sociedade.

Cuidado com Narciso

Já a "meninada" do MP não pode se refestelar diante de eventuais bombardeios da mídia sobre o arquipélago de políticos e magistrados. É imperioso reconhecer que o espelho de Narciso ilustra paredes de salas de um grupo de procuradores. Não há como deixar de reconhecer que alguns perfis apreciam os adornos de espetáculos espalhafatosos. Preparam atos litúrgicos para falas aguardadas com expectativa, investem-se de "salvadores da Pátria", assumindo a dicotomia: "ou nós ou o caos". Compreende-se o vigor com que fazem denúncias e investigações e é elogiável seu esforço para defender a sociedade contra máfias e teias de larápios que intentam surrupiar os cofres do Estado. O erro, quando há, está na dosagem exagerada. É inescapável a observação que aponta para a espetacularização de suas ações. Em suma, nem lá nem cá.