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A questão da prova da hipossuficiência e o novo CPC

Pedro Augusto Tavares Paes Lopes

Este trabalho versa sobre a questão da prova da hipossuficiência, cujo requerimento de concessão dos benefícios da Justiça Gratuita poderá ser feito pela parte interessada, a qualquer momento, durante o trâmite processual.

quarta-feira, 19 de abril de 2017

Atualizado às 08:04

A nossa Constituição Federal, outorgada em 5 de outubro de 1988, em seu artigo 5.º, caput e incisos XXXV, LV e LXXIV, assim dispõe (grifos nossos - g.n.) :

"Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;
(...)
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
(...)
LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos;"

Nessa perspectiva, sob a égide dos princípios constitucionais, orientadores de todo o arcabouço legislativo nacional, foi sancionado o novo CPC, lei 13.105, de 16 de março de 2.015, com vigência a partir de 18 de março de 2.016 .

Conforme o artigo 1.072, inciso III, do aludido diploma legal , foram revogados "os arts. 2.º, 3.º, 4.º, 6.º, 7.º, 11, 12 e 17 da lei 1.060, de 5 de fevereiro de 1.950".

A lei 1.060/50 , que estabeleceu normas para a concessão de assistência judiciária aos necessitados, quanto a estes artigos ora revogados, prescrevia que (g.n.):

Art. 2.º Gozarão dos benefícios desta Lei os nacionais ou estrangeiros residentes no país, que necessitarem recorrer à Justiça penal, civil, militar ou do trabalho.

Parágrafo único. Considera-se necessitado, para os fins legais, todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.

Art. 3.º A assistência judiciária compreende as seguintes isenções:

I - das taxas judiciárias e dos selos;

II - dos emolumentos e custas devidos aos Juízes, órgãos do Ministério Público e serventuários da justiça;

III - das despesas com as publicações indispensáveis no jornal encarregado da divulgação dos atos oficiais;

IV - das indenizações devidas às testemunhas que, quando empregados, receberão do empregador salário integral, como se em serviço estivessem, ressalvado o direito regressivo contra o poder público federal, no Distrito Federal e nos Territórios; ou contra o poder público estadual, nos Estados;

V - dos honorários de advogado e peritos;

VI - das despesas com a realização do exame de código genético - DNA que for requisitado pela autoridade judiciária nas ações de investigação de paternidade ou maternidade;

VII - dos depósitos previstos em lei para interposição de recurso, ajuizamento de ação e demais atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório.

Parágrafo único. A publicação de edital em jornal encarregado da divulgação de atos oficiais, na forma do inciso III, dispensa a publicação em outro jornal.

Art. 4º. A parte gozará dos benefícios da assistência judiciária, mediante simples afirmação, na própria petição inicial, de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família. (Redação dada pela lei 7.510, de 1986)

§ 1.º Presume-se pobre, até prova em contrário, quem afirmar essa condição nos termos desta lei, sob pena de pagamento até o décuplo das custas judiciais. (Redação dada pela lei 7.510, de 1986)

§ 2.º A impugnação do direito à assistência judiciária não suspende o curso do processo e será feita em autos apartados. (Redação dada pela lei 7.510, de 1986)

(...)

Art. 6.º O pedido, quando formulado no curso da ação, não a suspenderá, podendo o juiz, em face das provas, conceder ou denegar de plano o benefício de assistência. A petição, neste caso, será autuada em separado, apensando-se os respectivos autos aos da causa principal, depois de resolvido o incidente.

Art. 7.º A parte contrária poderá, em qualquer fase da lide, requerer a revogação dos benefícios de assistência, desde que prove a inexistência ou o desaparecimento dos requisitos essenciais à sua concessão.
Parágrafo único. Tal requerimento não suspenderá o curso da ação e se processará pela forma estabelecida no final do artigo 6.º desta Lei.

(...)

Art. 11. Os honorários de advogados e peritos, as custas do processo, as taxas e selos judiciários serão pagos pelo vencido, quando o beneficiário de assistência for vencedor na causa.

§ 1.º Os honorários do advogado serão arbitrados pelo juiz até o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o líquido apurado na execução da sentença.

§ 2.º A parte vencida poderá acionar a vencedora para reaver as despesas do processo, inclusive honorários do advogado, desde que prove ter a última perdido a condição legal de necessitada.

Art. 12. A parte beneficiada pela isenção do pagamento das custas ficará obrigada a pagá-las, desde que possa fazê-lo, sem prejuízo do sustento próprio ou da família, se dentro de cinco anos, a contar da sentença final, o assistido não puder satisfazer tal pagamento, a obrigação ficará prescrita.

(...)
Art. 17. Caberá apelação das decisões proferidas em consequência da aplicação desta lei; a apelação será recebida somente no efeito devolutivo quando a sentença conceder o pedido. (Redação dada pela lei 6.014, de 1.973)

De se ressaltar que a lei 6.654, de 30 de maio de 1.979 , e a lei 6.707, de 29 de outubro de 1.979 , que, respectivamente, acrescentou o parágrafo 3.º, e deu nova redação ao parágrafo 1.º, ambos atinentes ao artigo 4.º, foram revogadas pela lei 7.510, de 4 de julho de 1.986 , (apesar do aludido parágrafo terceiro não ter sido, expressamente, revogado por esta lei, o que será adiante elucidado, na própria mensagem de veto presidencial).

Na mensagem de veto da lei 7.510/86 , declarou-se que:

"Incide o veto sobre as partes que considero inconstitucionais e contrárias ao interesse público:

- As expressões 'devendo manter serviços organizados para tal finalidade' constantes do art. 1º da lei 1.060 de 5 de fevereiro de 1950 na redação proposta pelo art. 1º, e as expressões 'especialmente o parágrafo único do art. 2º e o §3º do art. 4º da lei 1.060, de 45 de fevereiro de 1950' constantes do art. 3º do Projeto."

Nesse sentido, em relação à questão orçamentária e de sua fiscalização, entendeu:

"As partes vetadas referentes ao art. 1º violam a autonomia estadual assegurada pelo art. 13 da Constituição Federal.

Aos Estados cabe prestar assistência judiciária aos necessitados logicamente dentro das condições que lhes são peculiares."

Em seguida, quanto à definição da condição de "pobre" ou "necessitado", esclareceu:

"As disposições referidas no art. 3º do Projeto apresentam várias impropriedades. Estabelece a revogação do parágrafo único do art. 2º e o parágrafo 3º do art. 4º da lei 1.060, de 5 de fevereiro de 1950.

A revogação do parágrafo único do art. 2º não pode ser admitida. O texto referido define, para os fins legais, quem se considera necessitado. Tal conceito deve permanecer explícito pois é baseado nele que se decidirá se determinada pessoa faz jus ou não à assistência judiciária, no caso de haver impugnação da condição de 'pobre' ou 'necessitado'. Embora a nova redação dada ao art. 4º da lei 1.060/50, refira-se a uma afirmação, a ser feita na petição inicial, de que a parte 'não está em condições de pagar às custas do processo e honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família' (dava a entender que este é o conceito de 'pobre'), é conveniente, a meu ver, que se mantenha o conceito formalmente expresso, tal como o parágrafo único do art. 2º faz. A afirmação de não poder pagar as custas etc..., prevista no art. 4º (com a nova redação), só tem sentido com a manutenção da definição mencionada."

Por fim, quanto ao parágrafo terceiro, do artigo 4.º, deixou-se consignado (g.n.):

"Além do que já foi exposto, o art. 3º do projeto de lei faz referência à revogação do parágrafo 3º do art. 4º da lei 1.060. Ora, tal parágrafo não existe (o art. 4º só tem dois parágrafos) não podendo, portanto, ser revogado. Por outro lado, com a nova redação dada ao art. 4º, não há qualquer necessidade de se explicitar sua revogação. "

No caso, o PL 1.433/48, que deu origem a lei ordinária 1.060/50, no seu artigo 1.º, estabeleceu que "o poder público federal e estadual concederá assistência judiciária aos necessitados nos termos da presente lei" (g.n.).

Já, a lei 7.510/86, cujo artigo 1.º foi vetado, dispunha da seguinte forma (g.n.):

"Art. 1º Os poderes públicos federal e estadual, independentemente da colaboração que possam receber dos municípios e da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, concederão assistência judiciária aos necessitados, os termos desta lei. "

Registre-se que o mencionado artigo 13, na mensagem de veto presidencial, refere-se à Constituição Federal de 1.967 , com a redação que lhe foi dada pela EC 1, de 10 de outubro de 1.969, que trata da autonomia estadual, em especial o inciso IV, que diz respeito à elaboração orçamentária e à fiscalização orçamentária e financeira, inclusive a aplicação dos recursos recebidos da União e atribuídos aos Municípios.

Desta feita, resta claro que o benefício da Justiça Gratuita tem relação direta com a arrecadação, tendo em mente que a sua concessão implica em renúncia tributária.

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*Pedro Augusto Tavares Paes Lopes é advogado no escritório Lopes&Lopes Advocacia.

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