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O papel do facilitador na conciliação e na mediação

O facilitador necessita provocar a empatia dos envolvidos, valorizando a presença dos advogados, pois o resultado positivo dos trabalhos se deve ao estabelecimento de confiança no procedimento e na competência do facilitador.

terça-feira, 25 de julho de 2017

Atualizado às 07:55

A sociedade brasileira vem passando por profundas transformações, seja do ponto de vista tecnológico, cultural, econômico e social, dentre outras. Essas mudanças acarretam novos e diferentes conflitos, pela falta de diálogo, de compreensão entre as pessoas e falha na comunicação, provocando um distanciamento e estimulando o pensamento individualista. A preocupação da pessoa se volta apenas para si próprio, sem o mínimo interesse pelo outro.

Essa intolerância e a falta de respeito ao próximo se intensifica em especial com o enorme crescimento populacional urbano, o aumento do nível de violência, que tem crescido assustadoramente, agravado pelo alto índice de desemprego, abarrotando o Poder Judiciário com milhões de intermináveis processos judiciais.

Com o advento da Constituição Cidadã de 1988, o Brasil privilegia os direitos fundamentais, a dignidade da pessoa humana e a celeridade na resolução dos conflitos, que não vem surtindo o merecido efeito até o momento em razão dos graves problemas que o país atravessa, criando um caos em todas as instituições e em todos os níveis, especialmente no Poder Judiciário.

No momento atual, em que a sociedade clama por mais justiça, são necessários de instrumentos mais eficazes de administração dos conflitos, que possam garantir a todos o direito a ter direitos, o direito de decidir seus problemas por si mesmos, que propicie uma justiça mais humana e mais justa para todos, para o exercício de uma efetiva democracia.

Surge, então, a conciliação e a mediação, como um meio democrático e decisivo na resolução de conflitos, para a cidadania e para a dignidade da pessoa humana, com foco na inclusão social, na valorização do ser humano e, em especial, na tão almejada pacificação social. O conflito, ainda que inerente à condição humana, seja ele positivo ou negativo, não basta existir por si mesmo, pois depende da capacidade ou incapacidade de geri-lo de uma forma eficiente.

Eis que surge a figura do conciliador ou do mediador, que doravante chamarei de "facilitador", que atua ajudando as partes a gerir o conflito de forma eficiente, estimulando e facilitando a sua resolução, sem indicar solução, para que as próprias partes, com a ajuda de seus advogados, sejam capazes de chegarem a um consenso.

A conciliação e a mediação são um meio consensual e não adversarial de resolução de conflitos, no qual o facilitador, tecnicamente preparado, atua num procedimento informal voluntário e confidencial, atuando como um pacificador, uma ponte entre as partes, em nada interferindo no mérito das decisões a serem tomadas, não decide, nem sugere solução, facilita a comunicação entre as partes e entre os advogados, através de perguntas, ajudando-as a criar opções para que cheguem a um consenso mutuamente satisfatório. Por vezes chegam até mesmo a redescobrir valores como a solidariedade e a humildade, na medida em que conduz as partes em conflito a uma composição amigável e espontânea.

Não é atribuição do facilitador, em hipótese alguma, esclarecer dúvidas jurídicas, não deve fazer julgamentos ou dar conselhos. Ele é e tem que ser absolutamente imparcial e neutro em relação ao caso, para não se tornar parte do problema. É exatamente por isso que se faz necessária a presença dos advogados, para garantir e preservar o direito das partes.

Ao desenvolver o seu trabalho na sessão, o facilitador necessita provocar a empatia dos envolvidos, valorizando a presença dos advogados, pois o resultado positivo dos trabalhos se deve ao estabelecimento de confiança no procedimento e na competência do facilitador. Deve ficar atento não apenas com a comunicação verbal, mas em especial com a comunicação não verbal, inclusive a sua para não passar uma mensagem equivocada.

As partes são os protagonistas e através de uma comunicação positiva e não violenta são conduzidas pelo facilitador a repensar suas posições e apoderar-se da possibilidade de construir com a outra parte um entendimento, promovendo assim o empoderamento das partes através do diálogo produtivo, construindo pontes que edificam as relações cooperativas, o que contribui favoravelmente para a preservação das relações, a satisfação do interesse de todos envolvidos e a economia de custos, de tempo e dinheiro, com menos desgaste emocional, além de beneficiar o próprio advogado que mais rapidamente vê solucionado o problema do seu cliente e mais rapidamente recebe seus honorários.

Em consequência, desafoga-se o Poder Judiciário, que se volta para as questões mais complexas e que devem ser decididas pelo próprio Estado, ficando assim preservada a imagem do próprio Poder Judiciário.

O Movimento pela Conciliação no Conselho Nacional de Justiça vem se preocupando desde 2006 com o conforto e valorização dos advogados nas sessões de conciliação e de mediação.

De fato, passados mais de dez anos, ainda reina um grande desconforto por parte de alguns advogados que já vivenciaram situações de constrangimento por parte de conciliadores e mediadores que, apesar de bem intencionados, ainda se encontram com capacitação deficiente, despreparados e mal treinados, conduzindo sessões de conciliação e de mediação desastrosas, seja por presunção, desinteresse ou porque não assimilaram de forma adequada as técnicas e ferramentas desses institutos.

Em alguns Cejuscs - Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania - ainda se sofre com a deficiência de capacitação de conciliadores e mediadores que, de forma totalmente arbitrária, ilegítima e ilegal, utilizam de pressões inoportunas para que a parte abra mão de direitos ou decidem, além do absurdo de constranger o advogado a aguardar fora da sala para se facilitar um acordo.

Caso qualquer advogado se deparar com conciliadores ou mediadores despreparados, arbitrários ou desrespeitosos ou que abusam de sua autoridade, deve representar ao Juiz Coordenador daquele Cejusc, na Corregedoria do CNJ ou ainda à Comissão de Prerrogativas de Advogado de sua subseção para as providências cabíveis.

Embora a lei permita o comparecimento da parte sem advogado no pré- processual, como é de conhecimento geral, não compete ao Cejusc e nem ao conciliador ou ao mediador vedar esse direito às partes. E, caso o facilitador detectar durante a sessão qualquer insegurança das partes, ou mesmo alguma dúvida jurídica para chegarem a um consenso, deve encerrar a sessão e redesignar nova sessão para que as partes consultem um advogado ou compareçam com seus advogados para garantia dos seus direitos, ficando bem atento para não incidir no erro de dar qualquer orientação jurídica, pois estará invadindo a competência do advogado e será passível de representação.

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*Marie Claire Libron Fidomanzo é advogada, conciliadora, mediadora em 1ª e 2ª instâncias, conciliadora na Justiça Federal da 3ª Região, arbitralista, professora e instrutora em Mediação de Conflitos pelo CNJ

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