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Julgamento

STF mantém posicionamento para permitir prisão após condenação em 2ª instância

Apesar de o ministro Dias Toffoli ter modificado entendimento e votado a favor da execução da pena somente após julgamento no STJ, a maioria se manteve por 6 votos a 5.

Da Redação

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Atualizado às 14:33

Por maioria apertada, 6 votos a 5, o plenário do STF indeferiu nesta quarta-feira, 5, duas medidas cautelares em ADCs (43 e 44), que buscavam reverter decisão da Corte que admitiu a execução da pena depois de decisão condenatória confirmada em segunda instância. As ações ainda serão julgadas no mérito.

Apesar de o ministro Dias Toffoli ter modificado entendimento e votado contra a possibilidade de execução da pena, se manteve o posicionamento da maioria, no HC 126.292, pela mudança da jurisprudência. Veja a diferença entre os julgamentos:

Julgamento das ADCs 43 e 44 Julgamento do HC 126.292
A favor da execução da pena Contra a execução da pena A favor da execução da pena Contra a execução da pena
Cármen Lúcia Celso de Mello Cármen Lúcia Celso de Mello
Edson Fachin Marco Aurélio (relator) Edson Fachin Marco Aurélio
Gilmar Mendes Ricardo Lewandowski Gilmar Mendes Ricardo Lewandowski
Luís Roberto Barroso Rosa Weber Luís Roberto Barroso Rosa Weber
Luiz Fux Dias Toffoli* Luiz Fux -
Teori Zavascki -

Teori Zavascki (relator)

-

-

-

Dias Toffoli

-

* o ministro Toffoli votou acompanhando a alternativa apresentada pelo relator, no sentido de permitir a execução da pena após a decisão condenatório do STJ.

Julgamento

O julgamento foi iniciado em 1/9 e suspenso após voto do ministro Marco Aurélio, relator, pelo deferimento da cautelar, reconhecendo a constitucionalidade do artigo 283 do CPP, para que sejam suspensas todas as execuções provisórias determinadas após a decisão de 2ª instância. Em seu voto, ao citar o inciso LVII, do art. 5º, da CF, "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória", o ministro destacou que a "literalidade do preceito não deixa margem para dúvidas": "a culpa é pressuposto da reprimenda, e a constatação ocorre apenas com a preclusão maior".

Na sessão de hoje, o ministro Edson Fachin abriu a divergência, para indeferir a cautelar e "declarar a constitucionalidade do art. 283 do Código de Processo Penal, com interpretação conforme à Constituição, que afasta aquela conferida pelos autores nas iniciais dos presentes feitos segundo à qual referida norma impediria o início da execução da pena tão logo esgotadas as instâncias ordinárias, assentando que é coerente com a Constituição o principiar de execução criminal quando houver condenação confirmada em segundo grau, salvo atribuição expressa de efeito suspensivo ao recurso cabível".

Fachin explicou que "art. 283 do CPP, em regra, exige o trânsito em julgado para a eficácia dos provimentos jurisdicionais condenatórios em geral". No entanto, os arts. 637 do CPP c/c os arts. 995 e 1.029, § 5º, ambos do CPC, "ao atribuir efeito meramente devolutivo aos recursos extraordinário e especial, excepcionam a regra geral do art. 283 do CPP, permitindo o início da execução quando o provimento condenatório for proferido por Tribunal de Apelação".

O ministro Luís Roberto Barroso também votou pelo indeferimento das cautelares, e dos pedidos subsidiários. Para Barroso, a Constituição brasileira não condiciona a prisão ao trânsito em julgado da condenação, mas sim à ordem escrita e fundamentada, conforme o art. 5º, LXI, da CF: "ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei". Assim, fundamentou seu voto com base na seguinte tese:

"É legítima a execução provisória da pena após a decisão condenatória de segundo grau, e antes do transito em julgado, para garantir a efetividade do direito penal e dos bens jurídicos constitucionais por ele tutelados, devendo-se conferir interpretação conforme à CF ao art. 283 do CPP, para excluir interpretação diversa".

Também acompanhou a divergência, o ministro Teori Zavascki. Para o ministro, o princípio da presunção da inocência "não pode esvaziar o sentido público de justiça, porque o processo penal deve ser minimamente capaz de prover para garantir a sua finalidade última de pacificação social". Ponderou ainda que é contraditório não permitir a execução da pena após decisão do tribunal de apelação, e dizer que a partir daí corre a prescrição da pretensão executória. "No meu entender, há uma contradição absoluta, porque a prescrição é justamente a omissão em promover a execução."

Já a ministra Rosa Weber acompanhou o relator. A ministra considerou que o art. 283 "espelha" o inciso LVII, art. 5º, da lei fundamental. O dispositivo estabelece que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória". Afirmou ainda que a interpretação está atrelada às possibilidades semânticas das palavras, "e, por isso, dela não posso me apartar frente à clareza do texto constitucional".

Diferentemente considerou o ministro Luiz Fux, que também acompanhou a corrente divergente, afirmando que o dispositivo que trata das condenações em segundo grau é o inciso LXI, do art. 5º, da CF. Assim, afirmou que, "se a vontade do constituinte fosse de condicionar a execução ao trânsito em julgado, ele teria inserido nesse dispositivo".

O ministro Dias Toffoli mudou o voto proferido no HC 126.292. Ele, que antes havia sido favorável à prisão após decisão de segunda instância, acompanhou em parte o ministro Marco Aurélio. Toffoli apresentou um voto intermediário, defendendo que a execução provisória da pena só será possível depois de julgamento de REsp pelo STJ, mas não de recurso extraordinário no STF. Explicou que a instituição do requisito de repercussão geral dificultou a admissão do recurso extraordinário em matéria penal, que tende a tratar de tema de natureza individual e não de natureza geral, ao contrário do recurso especial. O ministro afirmou ainda que a medida é uma maneira de impedir o uso abusivo de recursos e, ao mesmo tempo, a violação do princípio da presunção da inocência.

O ministro Ricardo Lewandowski também acompanhou o relator, mas integralmente. Para ele, não apenas a presunção da inocência, mas também a necessidade de motivação da execução da pena, afastam a possibilidade de a prisão ser determinada pelo tribunal de apelação. "Os tribunais simplesmente confirmam, batem o carimbo na decisão de primeiro grau."

Para o ministro Gilmar Mendes, que seguiu a divergência, após a confirmação da condenação pelo tribunal de segunda instância, "se ainda se pode falar em caso de presunção de inocência, ela é muito esmaecida". Portanto, justifica-se a execução da pena. Mendes considerou ainda que o sistema permite correção, "permite até o impedimento do início da execução da pena com liminar em HC", caso haja equívoco por parte do tribunal de apelação.

Por outro lado, o ministro Celso de Mello, que acompanhou o relator, ponderou que "a presunção de inocência constitui resultado de um longo processo", por isso, deve prevalecer até o trânsito em julgado da decisão condenatória. "Ninguém pode ser considerado culpado [...] sem que haja transitado em julgado decisão judicial condenatória." O ministro ressaltou também que a eventual inefetividade da execução penal, ou do próprio sistema punitivo, não pode servir de justificativa para transgredir a presunção de inocência. "Que se reforme o sistema processual [...], mas sem golpear um dos direitos fundamentais a que se fazem os cidadãos de uma República, fundada no princípio da liberdade."

Encerrando a discussão e desempatando o julgamento, a ministra Cármen Lúcia reiterou seu entendimento no sentido da possibilidade da execução da pena pelo tribunal de segunda instância. "O dispositivo segundo o qual ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória [LVII do art. 5º da CF] não exclui a possibilidade de se ter o início da execução penal." A ministra finalizou com a declaração:

"O acesso à Justiça não significa apenas acionar-se o Judiciário, mas ter-se uma resposta em tempo razoável."

Trânsito em julgado

Quando ocorre o trânsito em julgado no âmbito penal? Esse foi um dos questionamentos que fundamentou a discussão no plenário do STF. Em seu voto, o ministro Teori afirmou que o CPP não define o trânsito em julgado.

"A pura importação literal do conceito de trânsito em julgado que está no CPC, em sua literalidade, teria até uma certa dificuldade no âmbito do processo penal."

No entendimento do ministro, no sistema penal brasileiro, a coisa julgada não está necessariamente vinculada ao julgamento dos recursos extraordinários. O ministro Gilmar lembrou ainda que nas Cortes constitucionais internacionais já se fala em trânsito em julgado quando se encerra a fase ordinária.

Já o ministro Toffoli sustentou que "trânsito em julgado significa que se tornaram imutáveis os termos da sentença condenatória". Portanto, "interpretar trânsito em julgado como mero exaurimento dos recursos ordinários subverteria o propósito penal". No mesmo sentido, o ministro Lewandowski ressaltou que o artigo 5º, inciso LVII da CF é muito claro quando estabelece que a presunção de inocência permanece até trânsito em julgado. "Não vejo como fazer uma interpretação contrária a esse dispositivo tão taxativo."

Inefetividade do processo penal

Os ministros da corrente majoritária - a favor da execução provisória da pena após decisão de segunda instância - argumentaram, entre outros, a inefetividade do processo penal. "No Brasil, as condenações são postergadas por recursos aventureiros [...] Estamos mais preocupados com o direito fundamental do acusado e estamos esquecendo o direito fundamental da sociedade", afirmou o ministro Fux.

Para o ministro Barroso, "é preciso restituir ao direito penal esse papel mínimo de prevenção geral". "Se a sociedade desacreditar do sistema de justiça, você dá um estimulo à criminalidade."

ADCs

As ações foram ajuizadas pelo Partido Ecológico Nacional (PEN) e o Conselho Federal da OAB. O objetivo é o reconhecimento da legitimidade constitucional da nova redação do art. 283 do CPP:

"Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva."

O pedido de declaração de constitucionalidade do dispositivo surgiu da controvérsia instaurada em razão da decisão proferida pelo STF no HC 126.292. Na ocasião, por 7 votos a 4, o plenário considerou válido o cumprimento da pena de prisão antes do trânsito em julgado da condenação, retomando o entendimento jurisprudencial que prevalecia até 2009.

Para as entidades, o art. 283 do CPP visa condicionar o início do cumprimento da pena de prisão ao trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

Na ADC 43, o PEN sustenta que o dispositivo é uma interpretação possível e razoável do princípio da presunção de inocência, previsto no artigo 5º, inciso LVII, da CF. A OAB, na ADC 44, argumenta que a nova redação do dispositivo do CPP buscou harmonizar o direito processual penal ao ordenamento constitucional, espelhando e reforçando o princípio da presunção da inocência.

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