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O agravo de instrumento e a decisão sobre a suspensão de processos prejudiciais

quinta-feira, 31 de outubro de 2019

Atualizado às 09:29

Rogerio Mollica

As alterações promovidas no cabimento do recurso de agravo de instrumento foram sem dúvida as que geraram mais controvérsias na doutrina e na jurisprudência.

A decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao prever que a taxatividade quanto ao cabimento do agravo de instrumento seria mitigada e possível nos casos urgentes não previstos no artigo 1.015 do Código de Processo Civil1 não só não pacificou as questões quanto ao cabimento do Agravo, mas acabou gerando uma insegurança jurídica muito grande, pois o cabimento do Agravo de instrumento passou a ter um caráter subjetivo bastante importante.

Tal insegurança jurídica acaba por criar um efeito contrário ao pretendido pelo CPC/2015 quanto a limitação das hipóteses de cabimento do agravo de instrumento. De fato, na dúvida as partes acabam interpondo agravo de instrumento em face de quase todas as decisões interlocutórias e ao Judiciário cabe analisar se a decisão seria agravável em face da existência da urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação2.

Desse modo, o Superior Tribunal de Justiça vem sendo instado a decidir se diversas decisões interlocutórias, não previstas no rol do artigo 1.015 do CPC, poderiam ser passíveis de agravo de instrumento.

Recentemente, o STJ decidiu que a decisão interlocutória que indefere o pedido de suspensão do processo por prejudicialidade em relação a outro feito3 não seria passível de Agravo de Instrumento:

"CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE INDEFERE PEDIDO DE SUSPENSÃO DO PROCESSO POR PREJUDICIALIDADE EXTERNA. RECORRIBILIDADE IMEDIATA POR AGRAVO DE INSTRUMENTO COM BASE NO ART. 1.015, I, DO CPC/15. IMPOSSIBILIDADE. INSTITUTOS JURÍDICOS ONTOLOGICAMENTE DISTINTOS. AUSÊNCIA DE CAUTELARIDADE. INEXISTÊNCIA DE RISCO AO RESULTADO ÚTIL DO PROCESSO. SUSPENSÃO POR PREJUDICIALIDADE EXTERNA QUE NÃO SE FUNDA EM URGÊNCIA, MAS EM SEGURANÇA JURÍDICA E NO RISCO DE PROLAÇÃO DE DECISÕES CONFLITANTES. SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO QUE DEPENDE DA CONCESSÃO DE TUTELA PROVISÓRIA NA AÇÃO DE CONHECIMENTO AJUIZADA PELO EXECUTADO. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE COTEJO ANALÍTICO.

1- Recurso especial interposto em 29/05/2018 e atribuído à Relatora em 12/09/2018.

2- O propósito recursal é definir se a decisão interlocutória que indefere o pedido de suspensão do processo em razão de questão prejudicial externa equivale à tutela provisória de urgência de natureza cautelar e, assim, se é imediatamente recorrível por agravo de instrumento com fundamento no art. 1.015, I, do CPC/15.

3- Embora o conceito de "decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória" seja bastante amplo e abrangente, não se pode incluir nessa cláusula de cabimento do recurso de agravo de instrumento questões relacionadas a institutos jurídicos ontologicamente distintos, como a suspensão do processo por prejudicialidade externa.

4- Da existência de natural relação de prejudicialidade entre a ação de conhecimento em que se impugna a existência do título e a ação executiva fundada nesse mesmo não decorre a conclusão de que a suspensão do processo executivo em virtude dessa prejudicialidade externa esteja fundada em urgência, nem tampouco a decisão que versa sobre essa matéria diz respeito à tutela de urgência, na medida em que o valor que se pretende tutelar nessa hipótese é a segurança jurídica, a fim de evitar a prolação de decisões conflitantes, sem, contudo, descuidar dos princípios constitucionais da celeridade e da razoável duração do processo.

5- Cabe ao executado, na ação de conhecimento por ele ajuizada, demonstrar a presença dos requisitos processuais para a concessão de tutela provisória que suste a produção de efeitos do título em que se funda a execução, sendo essa decisão interlocutória - a que conceder ou não a tutela provisória pretendida - que poderá ser impugnada pelo agravo de instrumento com base no art. 1.015, I, do CPC/15.

6- Não se conhece do recurso especial interposto pela divergência jurisprudencial quando ausente o cotejo analítico entre o acórdão paradigma e o acórdão recorrido.

7- Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido." (g.n.)

(REsp 1759015/RS, Rel. ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/09/2019, DJe 20/9/2019)

Desse modo, o Superior Tribunal de Justiça segue "legislando" ao decidir quais decisões interlocutórias poderiam ser agraváveis desde logo e quais não.

Por fim, parece claro que no caso específico julgado pelo STJ, não sendo cabível a interposição do Agravo de Instrumento pela previsão do artigo 1.015, I, do CPC, seria possível a sua interposição pelo parágrafo único do referido dispositivo, eis que tratava-se de decisão interlocutória prolatada em execução.

__________

1 Tema Repetitivo nº 988: "O rol do artigo 1.015 do CPC/15 é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação". (REsp 1.704.520/MT, REsp 1.696.396/MT)."

2 Esse também é o entendimento dos processualistas André Roque, Luiz Dellore e Zulmar Duarte em artigo publicado na edição de 05 de agosto de 2019 deste site Migalhas: "Há grande instabilidade e insegurança em relação ao cabimento do recurso de agravo, sendo que o principal risco é se reconhecer a preclusão da interlocutória caso o agravo de instrumento não seja interposto. Assim, na dúvida, para evitar riscos, diante de uma análise de que há alguma "urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação", melhor que o profissional interponha o agravo de instrumento. Infelizmente, é o que se tem hoje".

3 Sobre o tema recomendasse a leitura da versão comercial da tese de livre docência do professor Paulo Henrique dos Santos Lucon: Relação entre demandas. Brasília: Gazeta Jurídica, 2016.