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Porandubas nº 472

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Atualizado às 09:30

Os juízes estão se tornando mestres de sabedoria, bom senso e até humor. Leiam o pronunciamento do juiz na audiência inaugural de uma ação. Abro a coluna com uma historinha do CE. O tema : um cabaré processado pela Igreja. Vamos ao caso. Em Aquiraz, região metropolitana de Fortaleza, Tarcília Bezerra começou a construção de um anexo do seu cabaré, a fim de aumentar suas atividades, em constante crescimento. Em reação contrária ao empreendimento, a igreja neo-pentecostal da localidade iniciou forte campanha para bloquear a expansão. Fez sessões de oração, em seu templo, de manhã, à tarde e à noite. Porém, o trabalho da construção progrediu até uma semana antes da reabertura, quando um raio atingiu o cabaré de Tarcília, queimando instalações elétricas e provocando um incêndio que destruiu tudo. Tarcília processou a igreja, o pastor e toda a congregação, com o fundamento de que a Igreja "foi a responsável pelo fim de seu prédio e de seu negócio, seja através de intervenção divina, direta ou indireta, ações ou meios". O certo é que o raio lhe causou enormes prejuízos, objeto de indenização. Em sua defesa na ação, a igreja negou veementemente toda e qualquer responsabilidade ou ligação com o fim do cabaré, inclusive pela falta de prova da intervenção divina e orações dos pastores. O juiz, veterano, leu a reclamação da autora Tarcília e a resposta dos réus, os pastores. Na audiência de abertura, abriu o verbo : "Não sei como vou decidir neste caso, pois pelo que li até agora tem-se, de um lado, uma proprietária de casa de tolerância, que acredita firmemente no poder das orações ; e do outro lado, uma igreja inteira que afirma que as orações não valem nada". Seria o caso de medir a propriedade deste conceito ? "A ciência sem a religião é aleijada e a religião sem a ciência é cega". Vamos, agora, à análise da conjuntura.

O imponderável

Que ninguém aposte em previsibilidade quando o território dos acontecimentos, principalmente na esfera da política, é o Brasil. Vejam só : o impeachment da presidente Dilma, até uma semana atrás, era coisa que entrava no baú. Depois da prisão do senador Delcídio do Amaral, entra novamente em cena. E por quê ? Porque o senador Delcídio é seguramente o parlamentar que mais entende de Petrobras. Portanto, é o homem certo para falar nesse momento sobre o propinoduto construído ao largo da petroleira.

Delação premiada

Caso aceite entrar na roda da delação premiada, Delcídio pode relembrar coisas do tempo em que era diretor internacional a quem se subordinava o gerente Nestor Cerveró. Pode dizer, entre outras coisas, quem lhe fazia pressão para resolver a compra de Pasadena. Quem lhe cobrava o fluxo de decisões. Quem lhe consultou sobre se Cerveró tinha condições técnicas de ficar em seu lugar. E pode, ainda, lembrar quem ajudou quem nas campanhas de Lula e Dilma. Delcídio é um dos parlamentares mais ligados e até então respeitado por Lula, que teria se referido ao episódio da conversa gravada por Bernardo no encontro com Delcídio de "burrada", algo como uma imbecilidade. E por que Delcídio abriria o bico ? Por pressão da família. Que quer rever o pai de família junto por ocasião do Natal e das comemorações de fim de ano.

Elasticidade

A interpretação do STF sobre a flagrância e atos considerados criminosos tende a se consolidar no espaço da jurisprudência. Ou seja, ato flagrante não se restringe aos acontecimentos tempestivos, ilícitos cometidos em determinado momento e pegos pelo aparelho policial. A obstrução de investigação, situação que pode perdurar por um tempo, entra nessa classificação. Daí a novidade. É evidente que os políticos estão temerosos de que casos assemelhados venham à tona e flagrados.

Se Delcídio falar....

Caso o senador decida dizer o que se sabe, a República fica de cabeça para baixo. Essa é, de modo geral, a visão que se projeta com a fala do ex-líder do governo no Senado. Não há dúvidas de que uma delação abrigando a presidente da República, o ex-presidente Luiz Inácio e outros protagonistas de alto coturno tende a criar fissuras no tecido institucional e abalar os alicerces da atual estrutura de poder. Ou será que o senador mato-grossense preferirá ficar em silêncio e correr o risco de uma condenação com prisão fechada e afastamento da esfera política ? Tudo aponta para a primeira hipótese. P. S. A mulher de Delcídio, Maika, teria dito que ele não deve pagar a conta do PT.

Os dias se sucedem...

Um interlocutor de Delcídio teria dito : "deixem estar, os dias se sucedem". A declaração se refere ao aborrecimento do senador em relação ao PT, que teria cometido "covardia atroz" e ao ex-presidente Lula, a quem se atribui a afirmação de que a conversa de Delcídio com o filho de Cerveró teria sido uma "burrada". Em suma, vem coisa pesada por aí.

Bumlai e cia

José Carlos Bumlai também deverá contar o que sabe. O fato é que seu envolvimento com o Grupo Schahin, tomada de empréstimos, compra de navio para a Petrobras, depósito em contas de familiares do ex-presidente Luiz Inácio, entre outras informações usualmente divulgadas pela imprensa, haverão de ser esclarecidas. Há muitas interrogações no meio dos números apontados. Bumlai deve ser intensamente questionado. O que querem saber é se ele cometeu alguma espécie de "burla".

Cunha tem alguma carta ?

O que Eduardo Cunha fará com os pedidos de impeachment que guarda em sua gaveta ? Alguns, ele já mandou arquivar. Mas há outros que ainda terão de receber um encaminhamento. Quanto mais ganhar tempo, melhor para ele. Ontem, o Conselho de Ética debateu a questão. Vejamos as duas possibilidades que se apresentam na Comissão de Ética : 1. Se decidir pela admissibilidade do processo de cassação do mandato do presidente da Câmara, o caso irá adiante. E o que Cunha fará ? O mais provável será o acolhimento do pedido de impeachment de Dilma. 2. Se decidir pelo arquivamento do processo contra ele, nesse caso, a hipótese mais provável é que o presidente da Câmara decida arquivar os pedidos de impeachment contra a presidente Dilma. Mas uma espada ainda paira sobre a cabeça de Cunha : um pedido do PGR, Rodrigo Janot, para que o STF o afaste da presidência da Câmara.

A qualquer momento

O procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, pode entrar a qualquer momento junto ao STF com pedido de afastamento de Eduardo Cunha do cargo de presidente da Câmara. O caminho seria uma ação cautelar nos termos da que foi usada no caso do senador Delcídio.

EUA : cinco perguntas

Na campanha entre Bill Clinton e Bob Dole, em 1996, cinco questões básicas relacionadas a valores permitiam prever se alguém votaria num ou noutro. Os que deram respostas predominantemente conservadoras votaram em Dole. Aqueles cujas respostas relevaram que estavam menos comprometidos com os valores tradicionais votaram em Clinton. As perguntas eram as seguintes :

1. Acredita que sexo antes do casamento seja moralmente errado ?

2. A religião é importante na sua vida ?

3. Já se interessou por ver pornografia ?

4. Tem opinião mais desfavorável sobre alguém que engana o cônjuge?

5. O homossexualismo é imoral ?

(Dick Morris em Jogos de Poder)

Reeleição de Cedraz

O presidente do TCU, Aroldo Cedraz, é candidato à reeleição. Sua candidatura abre polêmica, eis que o nome de seu filho, o advogado Tiago Cedraz, é relacionado com tráfico de influência. Nesse momento, a reeleição não seria aconselhável.

Gleisi

A senadora Gleisi Hoffmann é cotada para substituir o senador Humberto Costa na liderança do PT no Senado. Diz-se que ela suporta o tranco da oposição e não se encolhe. Mas ela aguentará denúncias de que teria se beneficiado com verbas dos negócios escusos da Petrobras desviados para sua campanha ?

Eleição com papel

Só mesmo por essas bandas. Depois de conquistarmos a tecnologia de ponta para uso nos pleitos - urnas eletrônicas - eis que os tribunais fazem um alerta : poderemos ter, em 2016, uma eleição na base da cédula eleitoral. Ou seja, podemos regredir aos velhos tempos. Interessante é observar que a eleição eletrônica acaba de ser objeto de investigação. A razão para a regressão : faltarão recursos para gastos com a tecnologia. E as urnas usadas anteriormente ? Será necessária a mesma quantidade ? As antigas tornaram-se imprestáveis ? Só mesmo no Brasil...

Zika

A microcefalia se espalha pelo país. Cerca de 1.300 casos já estão registrados. A doença se propaga na onda de expansão da dengue, doença transmitida pelo mesmo mosquito da febre chikungunya e zika, doença com origem nas florestas africanas. Em 2015, o país registrou 1.534.932 casos de dengue, febre chikungunya e zika. É o século passado abraçando o nosso século XXI.

Inadimplente

Se a meta fiscal não for aprovada este ano, o governo deve dar uma "pedalada" nas contas de água, luz e telefone. Será o fim da picada. O governo cortou R$ 11,2 bilhões do Orçamento (em despesas não obrigatórias). A máquina pública para, arrastando contas para 2016, além de atrasos em pagamentos de serviços terceirizados. A "pedalagem" para pagar no próximo ano é condenada pelo TCU. Daí a necessidade de mudar, já, a meta fiscal.

Recessão

Brasil se afunda na recessão. Economia encolheu 1,7% no terceiro trimestre, em comparação com o segundo trimestre. Trata-se da maior contração para um terceiro trimestre da série histórica do IBGE, de 1996, e a terceira retração seguida, prolongando o ambiente recessivo, que também já é o mais longo desde o governo Collor. Analistas esperavam queda de 1,2% frente ao segundo trimestre. Em relação ao terceiro trimestre de 2014, o PIB teve contração de 4,5% - a maior contração para um trimestre da série histórica do IBGE - e fechou os nove primeiros meses do ano com perda acumulada de 3,2%, também a maior da série. Em quatro trimestres, o resultado acumulado é de recuo de 2,5%, o pior desempenho de toda a série histórica.

Os livros errados

Brasília, Congresso Nacional, 11 de abril de 1964. Castelo Branco não teve o voto de Tancredo Neves, seu amigo pessoal de longa data, companheiro na Escola Superior de Guerra, em 1956. Tancredo bateu o pé. Comunicou ao PSD que votaria em branco, apesar dos méritos e credenciais do general Castelo Branco. Questão de princípio : era contra o golpe. Não queria nem um minuto de regime militar, não abria mão da democracia. Conta-se que, esgotados todos os argumentos dos pessedistas para convencê-lo, o amigo e ex-chefe JK, então senador por GO, fez um apelo : "Mas, Tancredo, o Castelo é um sorbonniano, estudou na França. É militar diferente, um intelectual como você. Já leu centenas de livros!". Tancredo : "É verdade, Juscelino. Só que ele leu os livros errados". Dois meses depois o governo cassou o mandato e os direitos políticos de JK, que partiu para o exílio e o sofrimento sem fim. (Caso narrado por Ronaldo Costa Couto)

Pequenas lições de marketing

  • Primeiras lições para pré-candidatos

Procurar saber para onde vai o vento, descobrir o rumo a seguir. Cada município comporta modelagem própria : condições geográficas ; proporção entre votos das áreas urbanas e rurais (áreas centrais e periféricas nas capitais) ; demandas regionais (bairros) ; cultura das comunidades ; infraestrutura ; colchões sociais (confortáveis/desconfortáveis), linguagens e demandas comuns ; lideranças comunitárias ; tipos folclóricos ; caciques e elites ; meios de comunicação, etc. Colocar todos esses ingredientes no liquidificador e extrair o caldo grosso. Bebericar em doses pequenas apurando o gosto. Adicionar pitadas dos elementos que faltam no caldo. Testar essa receita entre agosto e outubro.

  • Ciclos

Mais orientação : estabelecer adequado cronograma dos ciclos da pré-campanha e campanha. Pré-campanha, que já deve estar bem adiantada agora em dezembro ; lançamento, por ocasião da Convenção ; crescimento, entre quatro e cinco semanas após a Convenção ; maturidade/consolidação, quando a campanha se firma no sistema cognitivo do eleitor, após ampla visibilidade ; clímax, momento em que o candidato alcança seu maior índice de intenção de votos ; e declínio, quando o candidato tende a cair nas pesquisas de opinião. Todo esforço se faz necessário para o clímax ocorrer na semana das eleições. A dosagem dos ciclos há de obedecer ao funil da comunicação - jogando-se mais água (volume de comunicação/visibilidade) na segunda quinzena de setembro. Candidato que começa a soçobrar antes do tempo corre o perigo de morrer na praia.

"O maior sinal da derrota é quando já não se crê na vitória".