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Os Códigos de Ética/Conduta e a entrada em vigor da lei 12.846/13

A lei anticorrupção prevê que empresas com sólidas políticas de combate à corrupção poderão ter suas penas abrandadas. Com isso em mente, corporações estão investindo na criação de Códigos de Ética e Conduta.

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Atualizado em 22 de janeiro de 2014 14:09

Entra em vigor no dia 29 de janeiro de 2014, a lei 12.846/13 que trata da "responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira", carinhosamente apelidada, desde a apresentação e tramitação do projeto submetido pelo Poder Executivo em fevereiro de 2010, de "lei anticorrupção". A lei foi publicada no DOU no dia 02 de agosto de 2013.

A lei, que permite a punição de pessoas jurídicas que pratiquem atos de corrupção envolvendo funcionários públicos brasileiros ou estrangeiros, veio suprir uma lacuna no ordenamento jurídico brasileiro que anteriormente permitia apenas a punição das pessoas físicas responsáveis pela prática de atos de corrupção - ativa ou passiva - como regulados pelos artigos 317, 333 e 337 B, C e D do CP brasileiro.

A publicação da lei finalmente dá cumprimento total a um compromisso assumido pelo Brasil para efetivamente entrar na luta contra o suborno e a corrupção internacionais, perante a OECD (Organisation for Economic Co-operation and Development) em 1997, e ratificado em 2000. O Brasil já havia cumprido parcialmente a obrigação ao incluir os artigos antes mencionados no CP, por meio da promulgação da lei 10.467/02.

A nova lei incorpora alguns conceitos da legislação dos Estados Unidos da América sobre o assunto, ou seja, a lei sobre práticas de corrupção no exterior (The Foreign Corrupt Practices Act) publicado em 1977. Neste sentido, a legislação brasileira estipula que, em caso de violação às regras nela contidas, deverá ser levada em consideração na aplicação de eventuais sanções:

Art. 7º - Serão levados em consideração na aplicação das sanções:

"VIII - a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica." (artigo 7º inciso VIII da lei)


Isto significa que, empresas que tenham sólidas e efetivas políticas de combate à corrupção poderão ter suas penas reduzidas caso algum de seus funcionários venha a praticar algum ato que seja considerado uma violação das regras legais.

Com isso em mente um número realmente significativo de empresas iniciou, desde a publicação da lei, estudos e esforços para a implantação dos referidos mecanismos, com a criação de Códigos de Ética/Conduta, auditorias internas, mecanismos para possibilitar denúncias anônimas, etc.

Ocorre que, como se pode verificar pelo próprio texto da lei, não basta que se crie e que se implantem esses mecanismos. É preciso que eles sejam, efetivamente, postos em prática e que os colaboradores da empresa entendam a razão da sua existência, seus mecanismos e, principalmente, que confiem neles. Ou seja, a implantação desses mecanismos deve servir para criar uma cultura organizacional que estimule os colaboradores daquela empresa a manterem uma postura/conduta ética com relação aos negócios da empresa, bem como a plena observância da legislação aplicável.

É exatamente neste ponto que está o núcleo da questão; em como implantar um programa que seja bem delineado, compreensível por todos, e efetivo. Isto porque, a efetividade do programa será crucial para determinar se a empresa poderá (ou não) ter suas penas eventualmente reduzidas por ter implantado um programa anticorrupção.

De se notar que o parágrafo único do mencionado artigo 7º estipula que a efetividade do programa deverá ser objeto de avaliação,

"Parágrafo único - Os parâmetros de avaliação de mecanismos e procedimentos previstos no inciso VIII do caput serão estabelecidos em regulamento do Poder Executivo Federal."

Assim, não basta que as empresas criem belos Códigos de Ética/Conduta e meramente o distribua entre seus colaboradores como mais um dos muitos documentos que qualquer empregado recebe e/ou assina quando da sua contratação por uma empresa. É importante frisar que não existe Código de Ética/Conduta "genérico". Os Códigos têm de levar em consideração todas as especificidades da empresa e do ambiente de negócios em que a empresa atua. O exemplo mais claro disso é que profissões regulamentadas como medicina, advocacia, engenharia, farmácia, etc. têm seus respectivos Códigos de Ética que, embora contenham uma série de conceitos similares, são bastante diferentes entre si.

Além disso, considero imprescindível que os Códigos de Ética/Conduta, sejam entregues aos colaboradores ou durante ou seguido (no mais breve espaço de tempo possível) de uma sessão de treinamento onde se possa explicar e discutir o seu conteúdo para que se certifique de que o mesmo foi compreendido pelo colaborador. Na verdade, o ideal é que depois de uma curta sessão de treinamento sobre os conceitos mais gerais do código que pode ser ministrado a colaboradores de setores/departamento diferentes, que se faça, ao menos anualmente, sessões de treinamento específicos voltados a colaboradores que atuem em uma mesma área (ou em áreas similares) e que estejam sujeitos a exposição a relacionamentos com a diferentes partes interessadas (stakeholders).

Outro ponto de extrema importância é a disponibilidade de recursos, inclusive humanos, que possam ser facilmente consultados pelos colaboradores que tenham qualquer dúvida sobre o programa ou sobre a viabilidade de determinados atos ou ações à vista das regras contidas no código. Não menos importante é a existência de mecanismos que possibilitem denúncias sobre eventuais violações ao código bem como meios efetivos de proteção dos denunciantes de boa fé.

Finalmente, nada disso será possível se não se criar na empresa um ambiente de respeito e confiança entre os colaboradores, especialmente pelo comprometimento da alta direção da empresa, sem o que os preceitos do código nunca sairão do papel e jamais servirão ao seu propósito de construção de um mundo mais justo.
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* Marcos Lobo de Freitas Levy é advogado do escritório A. Lopes Muniz Advogados Associados.








 

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