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O estadista que nos falta

A missão do verdadeiro estadista não é simplesmente governar, administrar, mas, principalmente, liderar o país

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Atualizado em 20 de fevereiro de 2014 13:00

Luiz Felipe D'Avila, cientista político especializado em gestão pública, foi ouvido nas Páginas Amarelas da revista Veja (edição 2.359) em entrevista oportuna e muito bem enfocada. Não obstante todo seu brilho e acerto, a fala do entrevistado peca por uma injustiça e uma omissão.

A injustiça foi não incluir Getúlio Vargas entre os nossos grandes estadistas históricos. O Vargas do Estado Novo foi, sem dúvida, um ditador temível, inimigo declarado da democracia e do liberalismo, como bom discípulo do positivismo. Mas a pergunta a ser feita é: qual é o Getúlio que ficou e ficará na história? O ditador terrível, ou aquele político que garantiu a unidade do país, ameaçado de perto pela divisão política das oligarquias estaduais e pela divisão ideológica entre o comunismo e o integralismo? E muito mais: o ditador, ou o introdutor da primeira legislação trabalhista, ampliando os direitos sociais, como reconhece o próprio entrevistado? E o fundador da Siderúrgica e da Petrobras? E o reformador do ensino básico, com seu ministro Capanema, e da administração pública?

Vargas não foi um ditador comparável aos caudilhos dos países vizinhos. Ele foi um ditador quase ao estilo romano, aquele magistrado eleito, dotado de poderes absolutos, por período determinado, com a missão de salvar a República em momentos de grande perigo.

Getúlio preparou o terreno para Juscelino e seu desenvolvimentismo, descortinando nova fase para aquele país aparentemente condenado a resignar-se como um grande produtor agropecuário. JK foi a outra imperdoável omissão cometida por D'Avila.

Se pecou nas omissões, D'Avila acertou em cheio na escolha dos nove maiores estadistas brasileiros, a começar do paulista José Bonifácio de Andrada e Silva. Seguem-se Joaquim Nabuco, Dom Pedro II (quem diria?), Prudente de Morais, Campos Salles, Rodrigues Alves, Oswaldo Aranha, Ulysses Guimarães e Fernando Henrique Cardoso. Observe-se que nenhum deles merece o qualificativo, hoje tão em voga, de "pragmático". O termo é pífio. Para o pragmatismo o sucesso é o critério da verdade. Trata-se de visão oportunista e de curto alcance, que tem em vista as próximas eleições e não as próximas gerações. Para o verdadeiro estadista a política não se resume à conquista do poder. A política significa, antes de tudo, o fomento e o aumento da vitalidade nacional mediante um programa incitante de vida em comum. O "sucesso" não é tudo. Mais importante é a atuação do grande líder que permanece com seu exemplo lembrado para sempre.

A missão do verdadeiro estadista não é simplesmente governar, administrar o país.

Não só governar, mas, principalmente, liderar o país. E liderar significa criar novas oportunidades para todos mediante a parceria entre a sociedade e o Estado, de tal modo que cidadão e governo sintam-se unidos numa obra comum. Como dizia De Gaulle, com a sobranceria típica dos heróis, "a intendência vem por último". A intendência, isto é o aparelho administrativo. Primeiro vem aquele projeto de vida em comum no qual o mais humilde trabalhador sinta-se solidário com o líder supremo. Lembrando Schiller:

"Quando os reis constroem, têm que fazer os carpinteiros".

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* Gilberto de Mello Kujawski é procurador de Justiça aposentado, escritor e jornalista.


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