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As causas de dissolução parcial da sociedade empresária limitada

Roberta de Oliveira e Corvo Ribas

Uma análise das modalidades de desconstituição parcial de relação jurídica nas sociedades empresárias sob a forma de limitadas.

quarta-feira, 13 de maio de 2015

Atualizado em 12 de maio de 2015 12:05

1. Introdução

A análise da relação societária não está adstrita à análise dos direitos e obrigações criados entre duas partes. O caráter plurilateral nela contido exige atenção do operador não apenas no nascimento dessa relação jurídica - quando da constituição de uma sociedade, mas especialmente na sua morte. E assim se dá porque ao contrário do que ocorre em contratos bilaterais, o término da relação para uma parte não implica, obrigatoriamente, o término para as demais. A desconstituição de relação jurídica em matéria societária não significa, necessariamente, a extinção da totalidade das relações existentes e, menos ainda, da sociedade.

O presente trabalho tem por escopo analisar as modalidades de desconstituição parcial de relação jurídica nas sociedades empresárias sob a forma de limitadas. A limitação do tema às sociedades limitadas encontra razão em questões práticas. A sociedade limitada é, atualmente, a forma mais usada pelos empreendedores brasileiros. De acordo com dados recentes, tem-se que 98,68% das sociedades registradas na Junta Comercial de São Paulo são sociedades limitadas.1 Pelos dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, entre 1985 e 2005, de cada mil sociedades empresárias constituídas, novecentas e oitenta e nove eram do tipo limitada.2

Note-se que até algumas décadas atrás, a saída de qualquer sócio da sociedade resultava na sua dissolução total, sob o fundamento de que o caráter pessoal que permeava a relação entre os sócios não permitia flexibilidade em seu quadro social. Dessa forma, o afastamento de um único sócio provocava a dissociação do contrato social, desconstituindo-se a totalidade das relações jurídicas existentes e determinando-se o fim da personalidade jurídica.

O princípio que instiga a batalha pela possibilidade da continuidade da sociedade mesmo quando um sócio dela se afasta é o da preservação da empresa. A partir da década de 1970, passa a se tornar claro para doutrina e jurisprudência que a continuidade da exploração de atividades econômicas envolve interesse social, uma vez que sua relevância não está restrita unicamente aos interesses exclusivos de seus sócios, mas igualmente aos demais elementos da sociedade civil que dela se beneficiam. A empresa ativa emprega pessoas, paga impostos, cria um feixe de relações econômicas com diversos fornecedores e abastece seus clientes com bens e serviços.3

O embate entre uma estrutura normativa inspirada em princípios individualistas e o princípio da preservação da empresa se deu, inicialmente, por construção doutrinária e jurisprudencial. Apenas com a promulgação do CC de 2002, passou-se a expressamente regular a resolução da sociedade com relação a um sócio, permitindo que, não obstante o término de um vínculo da relação societária, sua existência permanecesse para dar prosseguimento às atividades empresariais. A então nova norma positivou uma série de preceitos que já vinham sendo construídos e aplicados pela doutrina e jurisprudência nacionais.

O CC/02, contrário à visão liberal e contratualista do CC de 1916 e do Código Comercial, recepcionou o princípio da preservação da empresa. Fornecendo mais ferramentas para a aplicabilidade ao artigo 170, III, da Constituição Federal, reconheceu na sociedade empresária seu caráter de instituição dotada de função social, o que já se via com as sociedades anônimas, conforme disposto nos Artigos 116, parágrafo único, e 117, parágrafo primeiro, alínea b, da lei 6.404/76.4

Nessa esteira, boa parte das causas que fundamentava a dissolução total de uma sociedade limitada foi direcionada para ocasionar a sua dissolução parcial (expressão costumeiramente usada para expressar a resolução em relação a um sócio). Questões relacionadas à condição de sócio, seus atos ou estado, conforme explicita José Waldecy Lucena, deixaram de ser causas dissolutórias e passaram a configurar justa causa para asaída do sócio.5 Além dessas, o falecimento, a falência e a denúncia unilateral passaram a constituir razões para dissolução parcial, e não mais para dissolução total. Dessa forma, em face de um problema com apenas um ou alguns sócios, o contrato social, entendido como plurilateral, resolver-se-ia simplesmente em relação a esse sócio (ou sócios), desfazendo-se este vínculo sem colocar em risco a continuidade da atividade empresarial. Limita-se a causa de dissolução total apenas a um fato que torne impossível a continuação da sociedade.

Tendo em vista a importância da dissolução parcial para a realidade atual do direito societário brasileiro, sendo a principal ferramenta para a concretização do princípio da preservação da empresa, o presente trabalho esmiuçará suas modalidades.

Confira a íntegra do texto.

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1 PARGENDLER, Mariana, O direito societário em ação: análise empírica e proposições de reforma, Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais, ano 16, 59, jan.-março 2013, p. 230.

 

2 MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO EXTERIOR. Juntas Comerciais. Disponível aqui.

 

3 COELHO, Fábio Ulhoa. A sociedade limitada no novo Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 152.

 

4 CARVALHOSA, Modesto. Comentários ao Código Civil: parte especial: do direito de empresa (artigos 1.052 a 1.195). In: AZEVEDO, Antônio Junqueira de. (Coord.) Comentários ao Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 13, p. 330.

 

5 LUCENA, José Waldecy. Das sociedades limitadas. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.

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*Roberta de Oliveira e Corvo Ribas é advogada do escritório Corvo Advogados. Master in Laws (LL.M.) pela Faculdade de Direito da Universidade da Filadélfia, mestre em Direito Comercial pela Faculdade de Direito da PUC/SP e doutoranda na Faculdade de Direito da Universidade Católica de São Paulo.

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