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Por uma nova Ordem

Para que efetivamente se renove a OAB/SP parece inexorável pactuar o fim da reeleição para presidente, democratizar as decisões, restituir o seu peso institucional e aumentar a transparência da gestão em todos os níveis.

terça-feira, 24 de novembro de 2015

Atualizado em 23 de novembro de 2015 10:56

Ultrapassado o período eleitoral na Secional paulista da OAB é preciso, em primeiro lugar, cumprimentar os vencedores. A gestão que agora termina teve seus méritos e foi aprovada nas urnas, concedendo-se novo mandato ao grupo encabeçado por Marcos da Costa.

Integrei esse grupo por seis anos, primeiramente como conselheiro e presidente da Comissão de Prerrogativas e, no mandato que finda em dezembro, ocupei o cargo de diretor secretário-geral adjunto.

Cumprida a minha missão e não possuindo mandato para o próximo triênio, continuarei a participar da política de classe e da vida corporativa, como venho fazendo há mais de trinta anos, razão pela qual gostaria de compartilhar algumas observações relacionadas a essa experiência político-institucional, visando à informação e reflexão dos advogados paulistas.

Faço-o somente após as eleições, porque não pretendi que uma visão crítica sobre a gestão da OAB de São Paulo tivesse apelo eleitoral. Mas, evidentemente, é um gesto político.

Durante o tempo em que exerci cargos na OAB-SP foi possível perceber distorções importantes e que tendem a acentuar-se com o tempo. Por isso, não encontrando no grupo situacionista um novo caminho que me restituísse o entusiasmo para o trabalho voluntário e a possibilidade de realizar meus anseios para a Advocacia e a Ordem, deixarei de participar da próxima gestão e desse grupo que mais uma vez comandará a Secional.

A primeira distorção decorre do fato de que as instâncias de poder deliberativo da OAB-SP estão completamente esvaziadas. Deslocam-se conselheiros de todas as partes do Estado a um custo elevado e o Conselho Secional consome praticamente a integralidade de seu tempo com o julgamento dos processos para a exclusão de faltosos, assim como os relativos à idoneidade exigida para a inscrição nos nossos quadros. O Conselho, já faz muito tempo, não decide sobre grandes temas. Não se consegue extrair da reunião de tantos advogados decisões substantivas para a Advocacia e a OAB. Isto precisa mudar! Bem que tentei implementar algumas mudanças para tornar as reuniões mais produtivas, mas essas propostas não foram vistas com verdadeiro interesse.

A diretoria, de igual modo, decide questões quase sempre burocráticas ou meramente administrativas. Dedica-se pouco, muito pouco, a questões realmente decisivas para a Advocacia. E isto porque se implantou entre nós um sistema eminentemente presidencialista, em que fica exclusivamente a cargo do presidente secional a expressiva maioria das decisões e condutas que importam para os advogados e para os destinos da OAB. Isto também precisa mudar!

Sintoma desse estado de coisas pode ser constatado nas recentes campanhas eleitorais, que de modo personalista se centralizam apenas no nome do candidato à presidência, como se não houvesse eleição para os diretores e mais 160 conselheiros, mandatários do soberano Conselho Secional. Desde o início, permanece esse valioso contingente de colegas num patamar secundário, sem capacidade de reação e influência mínima, situação que não pode continuar. Aliás, isto gera desinteresse e faz com que nas reuniões do Conselho - apesar de convocados os 80 conselheiros efetivos e os 80 suplentes -, em razão da ausência de conselheiros, muitas vezes reste prejudicado até mesmo o julgamento dos processos disciplinares dependentes do quórum qualificado de 54 presentes.

Outra mudança que tarda a ocorrer refere-se à qualidade das relações da Secional com as mais de 230 Subseções distribuídas pelo Estado. A relação é clientelista: a matriz dita regras, provê o caixa e determina, por isso mesmo e em grande parte, como devem as diretorias subsecionais administrar seu quinhão de poder institucional. Atualmente, muitas subseções, por exemplo, dependem de aprovação da Secional para adquirir bens de primeira necessidade ou fazer uma pequena reforma. Cumpre outorgar real autonomia para os advogados de cada localidade decidirem sobre os seus próprios rumos, abandonando-se para sempre essa velha prática, na qual impera a dotação para a subsistência em troca de apoio político-eleitoral.

Muito se discute, ademais, sobre a perda do protagonismo político de que a OAB e a secional paulista vêm padecendo. De fato, não obstante todos os esforços envidados para a correção dessa situação, os efeitos são pífios, isto porque, enquanto as distorções apontadas não forem superadas, não há quem possa reunir todas as condições para falar ao conjunto dos advogados e cuja voz ecoe no seio da sociedade, merecendo real respeito e acatamento. Isto também é passível de mudança!

Não há dúvida de que o grupo que permanece no poder para a quinta gestão consecutiva tem em suas fileiras advogados da melhor qualificação, muito bem intencionados, mas falta-lhes, à evidência, para a condução da OAB-SP, um programa de atuação que não se baseie em meros slogans, de modo a que a Entidade não caminhe ao sabor dos ventos, e, na maior parte das vezes, buscando posicionar-se de forma a angariar dividendos eleitorais. A total ausência de planejamento estratégico e de diretrizes preestabelecidas, construídos a partir de profunda e democrática discussão sobre as questões que envolvem a classe, propicia a concentração de poder e, desse modo, acarreta o desprestígio das instâncias decisórias colegiadas, além do empobrecimento das relações institucionais interna e externamente.

O quadro aqui exposto sinteticamente - havia muito mais a dizer -, enfraquece a Advocacia e a própria Ordem vê seu brilho esmaecido à medida que os anos vão passando e a realidade institucional permanece inalterada.

Para que efetivamente se renove a Ordem, entre tantas providências que se fazem necessárias, parece inexorável pactuar o fim da reeleição para presidente, democratizar as decisões, restituir o seu peso institucional e aumentar, significativamente, a transparência da gestão em todos os níveis.

Como revelei de início, não permanecerei no grupo por não concordar com o atual modelo de gestão para a OAB-SP, que concentra - é sempre conveniente lembrar - quase a metade dos advogados do país e sempre se constituiu no dínamo da Advocacia no Brasil.

Quem sabe, no futuro, possamos ultrapassar essas mazelas e alçar a Secional ao patamar a que ela pertence por força da sua gloriosa história e do peso da competente e vibrante Advocacia do nosso Estado. Para isso, é preciso mudar!

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*Antonio Ruiz Filho é advogado criminalista, ex-presidente da AASP e diretor da OAB/SP. Também foi diretor adjunto do IASP por duas gestões e presidente da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB/SP.

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