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A produção de efeitos da Medida Provisória 784

Sua utilidade é considerável para aumentar o espectro de atuação das entidades reguladoras, permitindo o alargamento da possibilidade de punição de administrados envolvidos em condutas ilícitas.

quarta-feira, 28 de junho de 2017

Atualizado em 27 de junho de 2017 08:18

A recentíssima MP 784 trouxe importantes alterações no marco regulatório estabelecido para os processos administrativos sancionadores das esferas de atuação do BACEN e da CVM. Vem causando bastante repercussão os novos patamares estabelecidos para as multas pecuniárias.

A norma prevê, no caso do BACEN, em relação às pessoas jurídicas, que ela não excederá a um percentual da receita de serviços e de produtos financeiros apurada no ano anterior ao da consumação do ilícito ou R$ 2 bilhões, aplicando-se dos dois referenciais o que for maior, como limite máximo. No regime anterior a multa era de, no máximo, R$ 250 mil.

No que se refere à CVM uma das possibilidades de multa passa a ter como limite o equivalente a 20% do faturamento total individual ou consolidado do grupo econômico. Trata-se de sanção rigorosíssima, que pode levar à quebra da empresa, prejudicando inclusive seus acionistas minoritários. Ademais, exatamente para não causar danos aos minoritários, a CVM aplica usualmente sanções apenas aos acionistas controladores e administradores das companhias abertas.

Na mesma linha se situa o limite relativo à emissão ou operação irregular, cujo montante da multa era o equivalente a 50% daquelas situações e agora passa a ser o equivalente ao dobro.

Já de algum tempo discute-se sobre a pouca expressividade do valor máximo dos limites de multa pecuniária então vigentes para os ambos os segmentos de mercado. Muito embora fosse razoável a majoração daqueles valores, afigura-se não proporcional a magnitude da elevação pretendida, o que poderá resultar em multas confiscatórias ou comprometimento da situação patrimonial do apenado, muito embora tenha sido previsto que na aplicação das penalidades será considerada, dentre outros requisitos, a capacidade econômica do infrator.

Os novos limites de multa pecuniária previstos pela medida provisória serão aplicáveis somente aos ilícitos administrativos ocorridos a partir de sua vigência, não incidindo assim sobre processos administrativos sancionadores já instaurados ou que venham a sê-lo e que tenham como objeto condutas ocorridas antes do novo regime legal.

Isso se deve à aplicação do princípio constitucional da irretroatividade da lei penal, o qual abrange não só os ilícitos de natureza criminal, mas também os administrativos. É uma decorrência da regra geral de que as normas jurídicas são estabelecidas para o futuro. A lei nova de caráter punitivo não pode retroagir em prejuízo do acusado, aumentando a pena que era cominada ao tempo em que praticara o ilícito. A irretroatividade das normas punitivas decorre das exigências de justiça e segurança jurídica, visando a impedir atuação casuística das autoridades e lesão aos direitos individuais dos cidadãos.

Aliás, e, não poderia ser diferente, vem sendo essa a postura assumida pelos diferentes reguladores de mercado, na instância administrativa, referendada pelo Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, nos processos administrativos sancionadores da área de atuação do Banco Central do Brasil e da Comissão de Valores Mobiliários.

Outra  questão disciplinada pela medida provisória e que já vem sendo discutida, posto que é novidade no que respeita à atuação do BACEN, é a possibilidade agora deferida a esse regulador para, em juízo de conveniência e oportunidade, deixar de instaurar ou suspender, em qualquer fase que preceda a tomada de decisão de primeira instância, o processo administrativo sancionador, se o investigado assinar termo de compromisso.

Essa forma alternativa de solução de conflito é um direito deferido ao administrado, o qual poderá, desde já, pleitear junto ao Banco Central do Brasil a sua aplicação a processos em andamento, pendentes de decisão na primeira instância administrativa, ainda que não tenha o instrumento sido objeto de disciplinamento específico por aquele regulador. Cabe à Administração acolher pedidos da espécie, de modo a não obstar o exercício do direito por parte do administrado, devendo, se for o caso, suspender o curso do processo administrativo sancionador objeto de requerimento nesse sentido, até que baixada a regulamentação devida.

Outro instrumento importante e que é algo novo para ambos os reguladores é a alternativa oferecida aos administrados de proporem a celebração de Acordo de Leniência a fim de que, colaborando para a apuração de fatos supostamente ilícitos, obtenham benefício representado pela redução ou extinção da penalidade aplicável. Trata-se da extensão para o Banco Central do Brasil e para a Comissão de Valores Mobiliários de instituto jurídico atual no nosso ordenamento, que vem sendo largamente utilizado no âmbito do Ministério Público Federal, bem como  pelo CADE. Sua utilidade é considerável para aumentar o espectro de atuação das entidades reguladoras, permitindo o alargamento da possibilidade de punição de administrados envolvidos em condutas ilícitas.

Entendemos que se aplicam imediatamente as normas sobre Acordo de Leniência, cabendo ao Bacen e à CVM receber o pedido, suspender o curso do processo, se for o caso, e negociar seus termos.

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*Nelson Eizirik é sócio do escritório Eizirik Advogados.

*Antônio Carlos Verzola é sócio do escritório Eizirik Advogados.

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