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Substituição de depósitos recursais por seguro garantia judicial ou carta de fiança bancária como alternativa de enfrentamento do estado de calamidade pública decorrente do novo coronavírus (covid-19)

Caso as medidas provisórias editadas pelo Governo Federal nas esferas trabalhista e tributária não sejam suficientes para ajudar as empresas a passaram pelo período de calamidade pública de forma menos gravosa, elas podem buscar a substituição de depósitos judiciais realizados para garantia de execuções trabalhistas.

quarta-feira, 8 de julho de 2020

Atualizado em 9 de julho de 2020 08:42

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A lei 13.467, de 11 de novembro de 2017, denominada de Reforma Trabalhista, alterou o artigo 882 e incluiu o §11 ao artigo 899, ambos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), para autorizar expressamente a garantia da execução por meio da apresentação de seguro garantia judicial, bem como a substituição do depósito recursal por fiança bancária ou seguro garantia, considerando que, até então, a CLT era omissa neste ponto, motivo por que referidas garantias eram aceitas na Justiça Especializada com base no artigo 9º da lei 6.830/80, que dispõe sobre a cobrança judicial da Dívida Ativa da Fazendo Pública, bem como no artigo 656, §2º, do CPC de 1973, atual artigo 835, §2º, do CPC de 2015, aplicados de forma subsidiária ao processo laboral nos termos do artigo 769 da CLT.

Não obstante a isso, por entender ser necessária a padronização dos procedimentos para a recepção destas modalidades de garantia nas execuções trabalhistas, o Tribunal Superior do Trabalho (TST), juntamente com o Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) e a Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho (CGJT), editaram o ato conjunto 1, de 16 de outubro de 2019, para dispor sobre o uso do seguro garantia judicial e fiança bancária em substituição a depósito recursal e para garantia da execução trabalhista.

Todavia, referido ato conjunto foi objeto de discussão no Conselho Nacional de Justiça, através do Procedimento de Controle Administrativo 0009820-09.2019.2.00.0000, apresentado pelo Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal (Sinditelebrasil), com fundamento em invalidade do ato por usurpar a competência privativa da União para legislar em matéria processual e por violar garantia da independência funcional do magistrado, ao interferir em sua atuação jurisdicional no que concerne a tema especifico.

Em análise perfunctória ao referido Procedimento de Controle Administrativo, em 03.02.20, o Conselheiro do CNJ, Mário Guerreiro, deferiu liminar para suspender a eficácia dos artigos 7º e 8º do Ato Conjunto, que assim estabeleciam:

Art. 7º O seguro garantia judicial para execução trabalhista somente será aceito se sua apresentação ocorrer antes do depósito ou da efetivação da constrição em dinheiro, decorrente de penhora, arresto ou outra medida judicial.

Parágrafo único. Excetuando-se o depósito e a efetivação da constrição em dinheiro decorrente de penhora, arresto ou outra medida judicial, será permitida a substituição, por seguro garantia judicial, de bem penhorado até sua expropriação, desde que atendidos os requisitos deste Ato Conjunto e haja anuência do credor (§ 2º do art. 835 do CPC);

Art. 8º Após realizado o depósito recursal, não será admitido o uso de seguro garantia para sua substituição.

Nota-se que o artigo 7º supracitado restringe a aceitação do seguro garantia judicial na execução trabalhista e, ainda, o condiciona à anuência do credor em situação especifica, ao passo que o artigo 8º vai na contramão do disposto no artigo 899, §11, da CLT, que autoriza expressamente a substituição de depósito recursal por fiança bancária ou seguro garantia judicial.

Entretanto, após a concessão de liminar pelo CNJ suspendendo a eficácia dos artigos 7º e 8º do ato conjunto 1/19, no dia 17.02.20, o Tribunal Superior do Trabalho, ao analisar o primeiro pedido desta natureza, formulado pela empresa LIQ CORP S/A nos autos do Agravo de Instrumento em Recurso de Revista - AIRR 0000214-53.2014.5.06.0019, deferiu a substituição de todos os depósitos judiciais realizados nos autos pelo seguro garantia apresentado pela empresa.

Já no dia 23.03.20, a decisão liminar proferida pelo Conselheiro Mário Guerreiro foi levada ao Plenário Virtual do Conselho Nacional de Justiça, que manteve a suspensão dos artigos 7º e 8º do ato conjunto 1/19, ao fundamento de afronta ao princípio da legalidade consagrado pelo artigo 37 da Constituição Federal e na independência funcional da magistratura consagrada pelo artigo 2º da Carta Magna.

Diante dessas decisões, e, mais, considerando o atual cenário de grave crise econômica vivenciada em nosso país em decorrência da pandemia do novo coronavírus (covid-19) - que obrigou Governos a editarem decretos restringindo e até mesmo proibindo o funcionamento de empresas de diversos seguimentos, como academias, shopping centers, cinemas, teatros, etc., o que vem impossibilitando as empresas impactadas de honrarem com suas obrigações fiscais, previdenciárias e trabalhistas -, entendemos que a substituição dos depósitos judiciais por fiança bancária ou seguro garantia pode ser uma alternativa de alívio no caixa das empresas que poderão utilizar deste dinheiro para honrar tais compromissos.

Importante ponderar que tal medida em nada prejudica o credor da execução trabalhista, uma vez que o seguro garantia e a fiança bancária são eficientes, pois, prestados por entidades confiáveis que honrarão suas obrigações caso a empresa fique inadimplente no processo trabalhista.

Além disso, de acordo com o §2º do artigo 855 do CPC, a fiança bancária e o seguro garantia equiparam-se a dinheiro para fins de substituição de penhora, desde que em valor não inferior ao do débito, acrescido de 30% (trinta por cento).

Nesse sentido é o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho consubstanciado na Orientação Jurisprudencial 591 da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais - SBDI II, que trata sobre o tema.

Deste modo, entendemos que, caso as medidas provisórias editadas pelo Governo Federal nas esferas trabalhista e tributária não sejam suficientes para ajudar as empresas a passaram pelo período de calamidade pública de forma menos gravosa, elas podem buscar a substituição de depósitos judiciais realizados para garantia de execuções trabalhistas como forma de amenizar os impactos da grave crise econômica atual, pois, poderão contar com dinheiro extra em seu caixa.

Em arremate, deve ser ponderado que, tendo em vista todas as medidas provisórias editadas pelo Governo Federal visando a garantia da continuidade das atividades laborais e empresariais, para afastar o risco de eventual indeferimento de tal pretensão, a empresa deverá comprovar que mesmo tendo se utilizado das medidas governamentais editadas para enfrentamento da pandemia não está sendo possível honrar com as obrigações decorrentes de folha de pagamento, tributos e fornecedores, estando diante de risco iminente de ter que encerrar por completo suas atividades.

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1 59.  MANDADO DE SEGURANÇA. PENHORA. CARTA DE FIANÇA BANCÁRIA. SEGURO GARANTIA JUDICIAL (nova redação em decorrência do CPC de 2015) - Res. 209/2016, DEJT divulgado em 01, 02 e 03.06.2016. A carta de fiança bancária e o seguro garantia judicial, desde que em valor não inferior ao do débito em execução, acrescido de trinta por cento, equivalem a dinheiro para efeito da gradação dos bens penhoráveis, estabelecida no art. 835 do CPC de 2015 (art. 655 do CPC de 1973).

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t*Alyne Conti Damiani Ferreira é advogada responsável pelo departamento trabalhista na Bernardo Jorge Sociedade de Advogados. Pós-graduada em Direito Processual Civil. Especialista em Direito do Consumidor. Atuante na advocacia trabalhista empresarial.  




t*Ricardo Souza Calcini
mestre em Direito pela PUC/SP. Professor de pós-graduação em Direito do Trabalho da FMU. Palestrante e instrutor de eventos corporativos "in company" pela empresa Ricardo Calcini | Cursos e Treinamentos.

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