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Decreto regulamentador trabalhista: Um mal necessário

O trabalhador só terá seu emprego garantido por mais 4 meses, ao findar o prazo do acordo, garantia essa que é a mesma daqueles que tiveram apenas a redução da jornada de trabalho, embora as perdas destes sejam menores. Se, ao findar esse prazo ele for demitido, terá perdas que aqueles que tiveram apenas a redução da jornada de trabalho não terão.

quarta-feira, 12 de agosto de 2020

Atualizado em 21 de agosto de 2020 12:29

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A princípio, cumpre dizer que o decreto 10.422, de 13 de julho de 2020, como já é de saber de todos, surge com o intuito de prorrogar os prazos previstos na lei 14.020, de 6 de julho de 2020, no que tange à redução da jornada de trabalho e à suspensão do contrato de trabalho.

Importante relembrar que, até então, o prazo máximo era de 90 dias para a redução de jornada de trabalho, e de 60 dias para a suspensão do contrato de trabalho, conforme se verifica:

Art. 7º Durante o estado de calamidade pública a que se refere o art. 1º desta Lei, o empregador poderá acordar a redução proporcional de jornada de trabalho e de salário de seus empregados, de forma setorial, departamental, parcial ou na totalidade dos postos de trabalho, por até 90 (noventa) dias, prorrogáveis por prazo determinado em ato do Poder Executivo, observados os seguintes requisitos:

I. Preservação do valor do salário-hora de trabalho;

II. Pactuação, conforme o disposto nos arts. 11 e 12 desta Lei, por convenção coletiva de trabalho, acordo coletivo de trabalho ou acordo individual escrito entre empregador e empregado; e

III. Na hipótese de pactuação por acordo individual escrito, encaminhamento da proposta de acordo ao empregado com antecedência de, no mínimo, 2 (dois) dias corridos, e redução da jornada de trabalho e do salário exclusivamente nos seguintes percentuais:

a) 25% (vinte e cinco por cento);

b) 50% (cinquenta por cento);

c) 70% (setenta por cento).

Art. 8º Durante o estado de calamidade pública a que se refere o art. 1º desta Lei, o empregador poderá acordar a suspensão temporária do contrato de trabalho de seus empregados, de forma setorial, departamental, parcial ou na totalidade dos postos de trabalho, pelo prazo máximo de 60 (sessenta) dias, fracionável em 2 (dois) períodos de até 30 (trinta) dias, podendo ser prorrogado por prazo determinado em ato do Poder Executivo.

Agora com decreto 10.422, de 13 de julho de 2020, passa a ser o prazo para a redução da jornada de trabalho acrescido de 30 dias, e para a suspensão do contrato de trabalho de 60 dias, totalizando 120 dias para ambos os casos conforme segue:

Art. 2º O prazo máximo para celebrar acordo de redução proporcional da jornada de trabalho e de salário de que trata o caput do art. 7º da Lei nº 14.020, de 2020, fica acrescido de trinta dias, de modo a completar o total de cento e vinte dias.

Art. 3º O prazo máximo para celebrar acordo de suspensão temporária do contrato de trabalho de que trata o caput do art. 8º da Lei nº 14.020, de 2020, fica acrescido de sessenta dias, de modo a completar o total de cento e vinte dias.

Parágrafo único. A suspensão do contrato de trabalho poderá ser efetuada de forma fracionada, em períodos sucessivos ou intercalados, desde que esses períodos sejam iguais ou superiores a dez dias e que não seja excedido o prazo de cento de vinte dias de que trata o caput.

Art. 4º O prazo máximo para celebrar acordo de redução proporcional de jornada e de salário e de suspensão temporária do contrato de trabalho, ainda que em períodos sucessivos ou intercalados, de que trata o art. 16 da Lei nº 14.020, de 2020, fica acrescido de trinta dias, de modo a completar o total de cento e vinte dias, respeitado o prazo máximo resultante da prorrogação de que trata o art. 3º.

Ocorre, no entanto, que aqueles trabalhadores que tiveram o contrato de trabalho suspenso têm uma perda maior do que aqueles que tiveram apenas a redução da jornada de trabalho, uma vez que a suspensão acarreta danos nas férias, no 13º salário, bem como o empregador não está obrigado a recolher o FGTS, uma vez o período de suspensão não é considerado para fins de contagem de tempo de serviço.

Assim sendo, o empregado que incorrer em 120 dias de suspensão do contrato de trabalho terá esse período todo descontado ao receber o 13º salário, bem como não ocorrerá o recolhimento do FGTS, a não ser que o empregador se disponibilize a pagar, o que não está obrigado a fazê-lo. Além do mais, esse tempo implica também em suas férias em um período futuro.

No que tange ao INSS, se o trabalhador com contrato suspenso quiser terá ele mesmo de arcar com o pagamento do valor, caso o empregador não se disponibilize a pagar. Nesse caso, não só o que tem o contrato de trabalho suspenso, mas o que passa pela redução da jornada de trabalho também. Mas vale ressaltar que, nesta particularidade, o empregador é obrigado a pagar a parte que lhe é cabível:

Art. 20. Ressalvado o disposto na alínea "b" do inciso II do § 2º do art. 21 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, as alíquotas das contribuições facultativas de que tratam o § 2º do art. 7º, o inciso II do § 2º do art. 8º e o § 6º do art. 18 desta Lei, serão de:

I. 7,5% (sete inteiros e cinco décimos por cento), para valores de até 1 (um) salário-mínimo;

II. 9% (nove por cento), para valores acima de 1 (um) salário-mínimo até R$ 2.089,60 (dois mil e oitenta e nove reais e sessenta centavos);

III. 12% (doze por cento), para valores de R$ 2.089,61 (dois mil e oitenta e nove reais e sessenta e um centavos) até R$ 3.134,40 (três mil, cento e trinta e quatro reais e quarenta centavos); e

IV. 14% (quatorze por cento), para valores de R$ 3.134,41 (três mil, cento e trinta e quatro reais e quarenta e um centavos) até o limite de R$ 6.101,06 (seis mil, cento e um reais e seis centavos).

§ 1º As contribuições de que trata o caput deste artigo devem ser recolhidas por iniciativa própria do segurado até o dia 15 do mês seguinte ao da competência.

§ 2º Na hipótese de suspensão temporária do contrato de trabalho, as alíquotas previstas nos incisos I, II, III e IV do caput deste artigo serão aplicadas de forma progressiva sobre o valor declarado pelo segurado, observados os limites mínimo e máximo a que se referem os §§ 3º e 5º do art. 28 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, incidindo cada alíquota sobre a faixa de valores compreendida nos respectivos limites.

§ 3º Na hipótese de redução proporcional de jornada de trabalho e de salário e na hipótese de que trata o art. 18 desta Lei, as alíquotas previstas nos incisos I, II, III e IV do caput deste artigo serão aplicadas de forma progressiva sobre a faixa de valores compreendida nos respectivos limites, incidindo sobre o somatório da remuneração declarada na forma do inciso IV do caput do art. 32 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, e do valor declarado pelo segurado, observados:

I. os limites previstos nos §§ 3º e 5º do art. 28 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991;

II. a incidência das alíquotas dos incisos I, II, III e IV do caput deste artigo primeiramente sobre a remuneração e, em seguida, sobre o valor declarado;

III. o recolhimento apenas das alíquotas incidentes sobre o valor declarado pelo segurado, sem prejuízo da contribuição de que tratam o art. 20 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, e o art. 28 da Emenda Constitucional nº 103, de 12 de novembro de 2019.

No entanto, vale ressaltar que esse pagamento pode não ocorrer. Na verdade, é o que vai acontecer na maioria das vezes, uma vez que o trabalhador já se encontra em uma situação difícil, com sua renda comprometida, posto que devido à suspensão do seu contrato de trabalho, o valor a receber será menor.

Lógico que essas perdas no momento em que nos encontramos, onde inúmeras pessoas estão perdendo seus empregos, é um mal que se torna necessário. Ninguém questiona isso, porém, o Governo, ao conceder a ampliação da suspensão, poderia melhor refletir sobre a situação desses empregados e colaborar com o pagamento ao menos do FGTS, se não quiser sobrecarregar o empregador obrigando que este efetue o recolhimento, uma vez que a situação deste também não é boa.

Aliás, isso seria útil até mesmo porque a garantia em contrapartida à suspensão do contrato de trabalho não é grande. O trabalhador só terá seu emprego garantido por mais 4 meses, ao findar o prazo do acordo, garantia essa que é a mesma daqueles que tiveram apenas a redução da jornada de trabalho, embora as perdas destes sejam menores. Se, ao findar esse prazo ele for demitido, terá perdas que aqueles que tiveram apenas a redução da jornada de trabalho não terão.

Equiparar as duas medidas talvez não seja uma medida justa. Algum benefício a mais deveria ser dado no caso de suspensão do contrato de trabalho que, como já dito, é um mal que se faz necessário e isso ninguém questiona. Mas talvez pudesse ser dado um amparo maior por parte do Governo, ainda que fosse um tempo de garantia do emprego maior.

A conscientização do empresário também é uma medida que ajuda, uma vez que alguns empregadores podem estar usufruindo dessa medida sem real necessidade. Assim, incentivar a empresa para que, em situações em que possa, usufrua de outras medidas, como a redução da jornada de trabalho em apenas 50%, já seria um ponto positivo, pois as duas partes teriam ganho: o trabalhador que continua empregado e não perde seus direitos de forma drástica, e o empregador que teria seus gastos reduzidos da mesma forma.

Incentivar o empregador a deixar a suspensão do contrato apenas para os casos extremos, como aqueles em que a empresa está de fato totalmente fechada, ou, ainda, nos casos em que seus clientes não estão lhe pagando corretamente.

 Assim, em realidade, não se deve apedrejar a suspensão do contrato de trabalho, mas sim a ocasião em que ela é utilizada, bem como as reais intenções de seu uso se, de fato, por necessidade ou apenas para ganho do empregador, e não há no que se falar no sentido de que isso não ocorre, uma vez que estamos vendo desvio de verbas destinadas à construção de hospitais e compra de respiradores enquanto pessoas morrem sem atendimento.

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t*Paula Landim Nazaré é advogada, pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho, membro da Comissão de Direitos Individuais e Coletivos do Trabalho da OAB subseção Juiz de Fora/MG.




t*Ricardo Souza Calcini é mestre em Direito pela PUC/SP. Professor de pós-graduação em Direito do Trabalho da FMU. Palestrante e instrutor de eventos corporativos "in company" pela empresa Ricardo Calcini | Cursos e Treinamentos.

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