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Trabalhista

Reconhecido vínculo empregatício entre motoboys e app de entregas Loggi

Ação civil pública foi ajuizada pelo MPT. Para magistrada, o não reconhecimento de vínculo implicaria em concorrência desleal.

Da Redação

segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

Atualizado às 10:32

A juíza do Trabalho Lávia Lacerda Menendez, da 8ª vara de São Paulo, declarou a existência de relação de emprego entre a empresa Loggi, que realiza serviço de entrega por meio app, e os motoboys que utilizam a plataforma. A decisão foi proferida em ação civil pública ajuizada pelo MPT.

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Ao ajuizar a ação, o parquet trabalhista fez diversos pedidos além do reconhecimento do vínculo empregatício. Dentre eles estão o pagamento do adicional de periculosidade aos motoboys; intervalo inter jornadas; descanso semanal; equipamentos de proteção individual etc.

Concorrência desleal

Ao analisar o caso, a magistrada declarou a existência de relação de emprego entre a empresa e os motoboys. Para ela, reconhecer vínculo empregatício entre empregado de pequena empresa de frete e não reconhecer com as maiores do segmento implicaria em chancelar franca concorrência desleal entre as empresas, com indevido favorecimento de mercado.

"A lei preserva a livre concorrência, mas não a concorrência desleal, como se sabe. Também não se avilta o direito à propriedade, na medida em que toda propriedade privada deve atender à sua função social."

A magistrada falou sobre a importância da proteção ao trabalhador, não deixando-o à margem das garantias e dos direitos individuais:

"Trabalhadores com maior poder de consumo, segurança e lazer, são a base de qualquer economia saudável, com qualidade de vida."

Além do reconhecimento do vínculo de emprego, a juíza determinou que a empresa se abstenha de contratar ou manter condutores contratados como autônomo; implemente o pagamento de adicional de periculosidade; implemente de forma efetiva e eficaz o controle da jornada de trabalho dos seus motoristas e condutores profissionais; limite a jornada diária de trabalho de seus condutores ao máximo de oito horas de serviço por dia, dentre outros.

Veja a íntegra da decisão.

Análise

Ricardo Calcini (Ricardo Calcini | Cursos e Treinamentos), especialista em relações trabalhistas avalia a decisão. Para ele, a via coletiva somente será apta quando for igualmente ou mais eficaz do que tutela individual, "o que não se verifica no caso dos motoboys da LOGGI".

Veja a íntegra da análise.

É certo que a decisão judicial se pautou na existência dos chamados direitos metaindividuais, traduzidos no caso nos direitos individuais homogêneos, de origem comum, na forma do inciso III do art. 81 do Código de Defesa do Consumidor, o que legitimaria a intervenção do Ministério Público do Trabalho.

Contudo, na temática relativa ao vínculo de emprego, vejo que os direitos ora postulados na ação civil pública, em realidade, não se enquadram em uma mesma realidade fática, tendo em vista que a aferição das lesões demanda o exame das particularidades das condições de trabalho de todos os motoboys substituídos, o que retira o caráter homogêneo dos interesses pleiteados.

Ora, seria necessário analisar, especificadamente, cada um dos motoboys para verificar a existência do seu efetivo direito ao vínculo de emprego, o que é absolutamente inviável na via eleita pelo MPT. Trata-se de inegável necessidade de dilação probatória, a fim de se demonstrar, de maneira inequívoca, quais motoboys existentes na empresa teriam, de fato, direito ao liame empregatício, bem como o montante que devido a cada um deles. Necessário se apurar, ainda, a forma de prestação de serviços de cada trabalhador, dias efetivamente trabalhados, jornada e os valores salariais recebidos.

Logo, afigura-se impossível protrair a aferição de algumas matérias, como é o caso da existência de efetiva relação de emprego, à fase executória, de modo que o Juízo precisaria considerar as especificidades de cada relação jurídica. Destarte, a demanda coletiva do MPT, nos moldes propostos, além de provocar inegável tumulto processual e comprometer a razoável duração e a efetividade do processo, poderia se revelar inviável. A via coletiva somente será apta quando for igualmente ou mais eficaz do que tutela individual, o que não se verifica no caso dos motoboys da LOGGI.

Por essa razão é que, no caso, se fará necessária a análise das datas de admissão e dispensa de cada motoboy (se for o caso), tempo de serviço, salário percebido por cada um deles, dentre outras condições que são personalíssimas de cada funcionário, em confronto com a norma coletiva aplicada.

Assim, não se está a negar a importância das chamadas ações sem rosto movidas pelo MPT, pois, por evidente, dá-se prevalência aos direitos comuns de determinado grupo ou categoria. Agora, em relação aos direitos marcados por peculiaridades ou singularidades, esses devem ser perseguidos individualmente, sob pena de prejuízo ao próprio titular do direito material.

Afinal, os desdobramentos de cada situação fática, marcada fortemente pela individualidade, não podem ser tratados e provados na ação civil pública ajuizada pelo MPT, sob pena de se comprometer o princípio da utilidade do processo.

Desse modo, a substituição processual realizada pelo MPT apenas incide nos casos em que os interesses em discussão sejam homogêneos, de origem comum, não compreendendo os casos em que o processo tratar de situações ou pedidos individualizados, ou seja, interesses heterogêneos, como é o caso dos motoboys da LOGGI.

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