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A censura do Estadão

A justiça brasileira é dominada pelo formalismo. Nem sempre. Mas quase sempre. Por exemplo, perder um recurso, por falta do recolhimento das custas judiciais, ou por recolhimento deficiente delas, ou quando o carimbo do cartório, relativo à publicação da decisão não está nítido, ali na cópia reprográfica.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Atualizado em 25 de maio de 2010 13:46


A censura do Estadão

Feres Sabino*

Sérgio Roxo da Fonseca**

A justiça brasileira é dominada pelo formalismo. Nem sempre. Mas quase sempre. Por exemplo, perder um recurso, por falta do recolhimento das custas judiciais, ou por recolhimento deficiente delas, ou quando o carimbo do cartório, relativo à publicação da decisão não está nítido, ali na cópia reprográfica. Ou, como no caso do Estado, por recurso processual considerado inadequado, sem que se considere a natureza essencial do seu conteúdo.

Dentro dessa realidade, o Estadão foi proibido de veicular qualquer matéria relativa ao filho de Senador da República, acusado por suposto tráfego de influência. Inocente ou culpado, o fato é notícia, do que resulta o direito do público ser informado.

Essa proibição envolve direitos fundamentais, sendo que em favor do filho do senador milita o princípio da dignidade da pessoa humana e o princípio da presunção de inocência, segundo os quais ninguém é culpado até sentença judicial da qual não caiba mais recurso; e, de outro lado, em favor do Estadão está a garantia da liberdade de imprensa, que decorre do direito à liberdade de expressão, conjugado com o direito à informação de cada pessoa e cidadão, com o reforço do dever constitucional do Estado Democrático de ser transparente, em seus atos e negócios.

Na verdade, há uma colisão de direitos fundamentais, cuja sacralidade e efetividade deveriam merecer do Judiciário uma apreciação sempre muito cuidadosa, e de mérito. Não poderia ficar no quadrado do formalismo. Entretanto, qual o critério que justificaria, ou não, a publicação de fatos pela imprensa?

Ora, esse critério somente pode ser o do interesse público. Assim, a pergunta é a seguinte: há interesse público na divulgação de atos e fatos censurados, no caso do Estadão, apesar de serem eles de interesse público?

Evidentemente, que há, há fatos veiculados indicando a presença da pessoa noticiada em trânsito pelos meandros da administração pública.

Mas, a questão decidida pelo STF foi processual, ou seja, formal, pois, o Estadão levou a questão constitucional à Suprema Corte através de um instrumento jurídico denominado "Reclamação" (clique aqui), cuja finalidade é restaurar a autoridade das suas decisões, que, no caso, já decidira sobre a revogação da Lei de Imprensa (clique aqui).

Contudo esta "Reclamação" levava em seu bojo a inconstitucionalidade apontada, pela violação de direito fundamental. E, sabe-se que, no direito brasileiro, "aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade". Nesse caso cabe.

Assim, se a reclamação rejeitada levou ao conhecimento do Supremo uma decisão inconstitucional, independentemente da natureza formal do recurso utilizado, deveria ocorrer uma decisão de mérito, na lição do grande constitucionalista português J. J. Gomes Canotilho. Para ele, qualquer decisão judicial que contenha uma violação de direito fundamental da pessoa, deve ela ser assumida e desfeita, em nome da sacralidade do direito fundamental e da sua efetividade. E, diz mais, já que tal pronunciamento obrigatório, para retirar do mundo jurídico a "inconstitucionalidade".

Mas, para isso, a Justiça não poderia ser formalista. Para isso, um novo espírito deveria invadir o Judiciário, para essa espécie de revolução.

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*Procurador Geral do Estado, no Governo Montoro.

 

 

 




 

**Procurador de Justiça aposentado do Ministério Público de São Paulo





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