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Transporte

Companhia aérea é condenada por impedir embarque de pessoa com deficiência

Avianca vai pagar R$ 5 mil a tetraplégico impedido de embarcar por conta de problema no despacho da cadeira de rodas.

Da Redação

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Atualizado em 21 de dezembro de 2012 11:25

A juíza de Direito substituta da 4ª vara Cível de Brasília condenou a empresa Avianca a pagar R$ 5 mil de indenização por danos morais a tetraplégico que foi impedido de embarcar por conta de problema no despacho da cadeira de rodas. A empresa de transporte aéreo também terá que pagar R$ 255 de danos materiais de reembolso da passagem.

O passageiro adquiriu da Avianca passagens aéreas para os trechos de ida e volta entre Brasília e Salvador. Conseguiu embarcar normalmente de Brasília para Salvador, mas apesar de ter chegado com muita antecedência para realizar o check in para a viagem de volta, foi impedido de embarcar porque a Avianca apontou problemas no despacho de sua cadeira de rodas, da qual faz uso na condição de tetraplégico. A requerida exigiu que ele retirasse a bateria de sua cadeira de rodas, mas quando a questão foi solucionada, o vôo já havia decolado. Após o ocorrido, a Avianca não mais o embarcou em outro vôo, tendo que adquirir passagens por outra empresa área.

No tocante aos danos materiais a juíza decidiu que "embora o autor não tenha demonstrado que adquiriu outro trecho para o retorno a Brasília, a requerida não logrou demonstrar que o autor efetivamente embarcou em outro voo fornecido por ela ou que reembolsou o autor pelos valores do trecho não usado por ele, restando concluir que o trecho de volta não foi efetivamente utilizado".

Quanto aos danos morais a julgadora decidiu que "é inefável o ferimento à dignidade do autor que, portador de necessidades especiais, se viu surpreendido com a recusa de seu embarque em razão de suposta proibição de transporte aéreo da substância de sua cadeira de rodas, tendo permanecido sem qualquer assistência ou realocação em outro voo".

__________

SENTENÇA

Cuida-se de ação de INDENIZAÇÃO ajuizada por N.L.B.J. em desfavor de AVIANCA EMPRESA DE TRANSPORTE AÉREO, ambos qualificados nos autos.

Narra o autor, em síntese, que adquiriu da requerida passagens aéreas para os trechos de ida e volta entre Brasília e Salvador. Conseguiu embarcar normalmente de Brasília para a cidade de Salvador, mas, embora tenha chegado com muita antecedência para realizar o check in para realizar a viagem de volta no dia 19.04.2011, foi impedido de embarcar porque a requerida apontou problemas no despacho de sua cadeira de rodas, da qual faz uso na condição de tetraplégico. A requerida exigiu que ele retirasse a bateria de sua cadeira de rodas, mas quando a questão foi solucionada, o vôo já havia decolado.

Após o ocorrido, a requerida não mais o embarcou em outro vôo, tendo que adquirir passagens por outra empresa área, o que conseguiu fazer somente no dia 27.04.2011. Alega, portanto, que o fato lhe trouxe enormes dissabores, máxime em razão de suas condições físicas debilitadas, fato que, inclusive, o prejudicou em outro processo que move na Justiça.

Postula indenização por danos materiais, referentes à nova passagem aérea que comprou, além de alimentação e transporte, bem como indenização por danos morais.

Instruiu a inicial com os documentos de fls. 22/32.

Citada, a requerida contestou às fls. 41/75, postulando, inicialmente, pela denunciação da lide da empresa Interline Turismo, que foi a vendedora direta das passagens aéreas.

No mérito, afirma que agiu seguindo as normas da Anac e a legislação federal no tocante aos critérios para embalagem de bagagem, os quais não foram seguidos pelo autor. Aduz que indevidos os danos materiais porque não foram provados pelo autor e também indevidos os danos morais, uma vez que a requerida não praticou qualquer ilicitude. Por fim, impugna o valor postulado a título de indenização por danos morais.

Acostou os documentos de fls. 76/119.

Réplica às fls. 123/129.

Vieram os autos conclusos para prolação de sentença.

É o relatório.

DECIDO.

Promovo o julgamento antecipado da lide, como quer a dicção do art. 330, inc. I, do Código de Processo Civil.

No tocante ao pedido de denunciação da lide, importa registrar que, tratando-se de demanda sujeita aos ditames do Código de Defesa do Consumidor, recomendável seu indeferimento, em razão do que vem expresso no artigo 88, do Código de Defesa do Consumidor.

Embora a jurisprudência tenha abrandado a vedação para admiti-la em certos casos de relação de consumo, entendo que, na hipótese, redundaria em atraso prejudicial ao consumidor, pelo que, deve ser indeferida.

Passo ao exame do mérito.

A questão diz respeito a alegada falha na prestação de serviços ofertados pela ré que, ao impedir o despacho da cadeira de rodas de que faz uso o autor, no momento do check in, acabou por ensejar a perda do vôo por ele que acabou tendo de adquirir nova passagem por outra companhia aérea.

A ré, por sua vez, confirma a dinâmica dos fatos, limitando-se a afirmar que recusou o despacho da cadeira de rodas porque ela continha bateria com substância proibida ao transporte aéreo.

A presente demanda se enquadra entre aquelas regidas pelo Código de Defesa do Consumidor, uma vez que o autor subsume-se ao conceito de consumidor de serviços de transporte aéreos, enquanto a ré, ao de fornecedora de tais serviços, tudo em consonância com o disposto nos artigos 2º e 3º, do CDC.

E sabe-se que o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos (CDC, art. 14).

Na espécie, incontroverso que o autor, embora tivesse embarcado com sua cadeira de rodas regularmente no vôo de ida, foi impedido de embarcar com a mesma cadeira de rodas e na mesma empresa aérea no vôo de volta ao argumento de que o transporte da bateria do equipamento era proibido pela Anac.

Também incontroverso que a questão acabou resultando em perda do vôo pelo autor e ausência de realocação dele em outro vôo ou de reembolso dos valores despendidos por ele para aquisição de nova passagem aérea.

É certo que poderá o transportador recusar a coisa cuja embalagem seja inadequada, bem como a que possa pôr em risco a saúde das pessoas, ou danificar o veículo e outros bens (Código Civil, artigo 746) e o transportador deverá obrigatoriamente recusar a coisa cujo transporte ou comercialização não sejam permitidos, ou que venha desacompanhada dos documentos exigidos por lei ou regulamento (Código Civil, artigo 747).

Não se descura de que a segurança de vôo deve seguir diretrizes e regulamentação próprias, como aquelas que tratam do transporte de material corrosivo (Portaria DGAC nº 703/DGAC, de 22/7/2005 - Instrução de Aviação Civil IAC nº 153-1001/2005, e artigo 21 do Código Brasileiro de Aeronáutica - Lei 7.565/86).

O que se vislumbra na hipótese, porém, é conduta contraditória, desarrazoada e abusiva por parte da requerida que incorreu em falha no dever de informar ao aceitar o embarque da cadeira de rodas com a bateria própria no trecho de ida, tendo gerado no consumidor a expectativa de um embarque autorizado também para a volta, que, entretanto acabou sendo recusado.

Demais disso, os documentos de fls. 130/131 indicam que a bateria em questão era aprovada para o transporte aéreo, não tendo a requerida impugnado a veracidade desses documentos, nem demonstrado que a bateria, de fato, continha material corrosivo.

Veja-se, pois, que a requerida não se limitou a praticar condutas de segurança de vôo, tendo extrapolado de seu direito de velar pela segurança do transporte, pois aceitou fazer o transporte no trecho da ida e, sem respaldo técnico comprovado, recusou transportar a cadeira de rodas no vôo da volta.

Abusiva a conduta, nos termos do artigo 187, do Código Civil, restam configurados os requeridos autorizadores da responsabilidade civil. Ademais, patente a falha na prestação de serviços que redundou na perda do vôo e aquisição de nova passagem aérea pelo consumidor.

Por essa razão, demonstrado o nexo de causalidade entre a conduta ilícita da demandada e os danos experimentados pelo consumidor, não há causa excludente de responsabilidade (Art. 14, § 3º, inciso III, Código de Defesa do Consumidor).

No tocante à indenização a título de danos materiais, recai sobre o consumidor o ônus de trazer aos autos as provas dos valores que efetivamente despendeu em razão da falha cometida pela fornecedora de serviços (CPC, artigo 333, inciso I).

Entendo provado nos autos tão somente a perda do trecho de volta, no valor de R$ 255,66, pois o valor de R$ 511,32 é o valor total adquirido para duas pessoas (fls. 25).

Embora o autor não tenha demonstrado que adquiriu outro trecho para retorno à Brasília, a requerida não logrou demonstrar que o autor efetivamente embarcou em outro vôo fornecido por ela ou que reembolsou o autor pelos valores do trecho não usado por ele, restando concluir que o trecho de volta não foi efetivamente utilizado.

No tocante aos alegados danos morais, tenho que o fato, por si só, é ensejador violação a direitos de personalidade, pois gerou angústia e aborrecimento que em muito superam aqueles sofridos em situações cotidianas.

É inefável o ferimento à dignidade do autor que, portador de necessidades especiais, se viu surpreendido com a recusa de seu embarque em razão de suposta proibição de transporte aéreo da substância de sua cadeira de rodas, tendo permanecido sem qualquer assistência ou realocação em outro vôo.

Interessante, sobre o tema, o escólio de Sérgio Cavalieri Filho:

"Neste ponto a razão se coloca ao lado daqueles que entendem que o dano moral está ínsito na própria ofensa, decorre da gravidade do ilícito em si. Se a ofensa é grave e de repercussão, por si só justifica uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado. Em outras palavras, o dano moral existe in re ipsa; deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre da regras da experiência comum." (in Programa de responsabilidade civil. 5 edição. São Paulo: Editora Malheiro, 2004. p. 100)

A fixação do quantum indenizatório é questão tormentosa na doutrina e na jurisprudência pátrias. O certo é que, não havendo critério rígido para ser fixado, o juiz deve examinar as condições do ofensor, do ofendido e do bem jurídico lesado, considerando sempre seu aspecto compensatório e o nexo causal, como dispõe o art. 403, do CC.

Segundo Sérgio Cavalieri Filho, "não há, realmente, outro meio mais eficiente para se fixar o dano moral a não ser pelo arbitramento judicial. Cabe ao juiz, de acordo com o seu prudente arbítrio, atentando para a repercussão do dano e a possibilidade econômica do ofensor, estimar uma quantia a título de reparação pelo dano moral" (in Programa de responsabilidade civil. 8 ed. Jurídico Atlas, 2008. p. 91)

Em casos como o presente, razoável fixar o montante em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), quantia capaz de reparar os danos sofridos pelo autor sem proporcionar-lhe enriquecimento sem causa, que fugiria à finalidade da indenização. O valor atende ao disposto no art. 944, do CC, e aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Por tais fundamentos, com fulcro no art. 269, inc. I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE o pedido deduzido na inicial para condenar a requerida a: 1) pagar ao autor a quantia de R$ 255,66 (duzentos e cinqüenta e cinco reais e sessenta e seis centavos) a título de indenização por danos materiais, corrigida monetariamente desde 19.04.2011 e com juros de mora desde a citação; 2) pagar ao autor R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a título de indenização por danos morais, quantia esta que deverá ser corrigida monetariamente e com incidência de juros de mora legais desde a publicação desta sentença;

Custas e honorários advocatícios de 10% sobre o valor da condenação pela requerida.

Após o trânsito em julgado, a parte requerida terá o prazo de 15 (quinze) dias para cumprir a condenação, sob pena de multa de 10% (dez por cento), nos termos do artigo 475-J, do Código de Processo Civil.

Oportunamente, dê-se baixa e arquivem-se os autos.

Publique-se. Intimem-se.

Brasília - DF, 10 de dezembro de 2012.

Rachel Adjuto Bontempo Brandão

Juíza De Direito Substituta

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